Os últimos momentos de 'Gegê' e 'Paca', segundo o piloto preso

Felipe Morais pilotava a aeronave que levou os executores. Ele foi ouvido em Goiás, por dois delegados do Ceará

Escrito por Cadu Freitas - Repórter ,

"Vocês estão loucos, vocês estão loucos?", teriam sido as últimas palavras de Rogério Jeremias de Simone, o 'Gegê do Mangue'; e Fabiano Alves de Souza, o 'Paca', no dia 15 de fevereiro deste ano, na Reserva Indígena Jenipapo-Kanindé, em Aquiraz, pouco antes de serem assassinados pelos, até então, parceiros de facção.

O relato foi feito pelo piloto Felipe Ramos Morais, em depoimento aos delegados Harley Filho e Alceu Viana, da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), que viajaram à Goiânia, onde o piloto está preso. Ele foi indiciado pelo duplo homicídio dos líderes do PCC, no Ceará.

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Seis dias antes da execução de 'Gegê' e 'Paca', Felipe Ramos chegava ao Ceará com a namorada. Era sexta-feira de Carnaval e o plano para matar os dois líderes do PCC era engendrado. O piloto teria vindo à Capital cearense a mando de Wagner Ferreira da Silva, o 'Cabelo Duro'.

Entre a sexta e a terça-feira de Carnaval, Felipe ficou hospedado em um hotel, na Praia do Cumbuco, em Caucaia, Região Metropolitana de Fortaleza. Na Quarta-feira de Cinzas, um dia antes da morte de 'Gegê' e 'Paca', o piloto teria recebido uma ligação de 'Cabelo Duro' para fazer um voo panorâmico.

No helicóptero, antes mesmo de começar a voar, Felipe reconheceu Renato Oliveira Mota, suspeito de auxiliar os executores. Wagner, então, teria pedido ao piloto para fazer um voo até a Praia do Futuro e perguntado se ele conhecia algum heliponto. "Eu disse que sabia, já que tinha um local que era de um amigo meu", relatou.

No dia da execução, Felipe Ramos acordou cedo ao lado da namorada. Às 7h30, 'Cabelo Duro' ligou para saber onde ele estava e exigiu sua presença o mais brevemente possível. Ao chegar na Chopper Solutions, Wagner teria dito que, antes do trajeto de volta à São Paulo, fariam um voo local, pois os planos haviam mudado. Duvidando se a própria vida estaria em jogo, Felipe Morais avistou André Luís da Costa Lopes, o 'Andrezin da Baixada', que o teria agredido em janeiro, e embarcou ressabiado.

Além dele, embarcaram na aeronave Tiago Lourenço de Sá de Lima; Ronaldo Ferreira da Costa; Erick Machado dos Santos, o 'Nego Rick da Baixada'; e Carlenilto Pereira Maltas. No caminho até Aquiraz, Wagner teria dito que iriam participar de uma reunião. Chegando lá, em uma clareira, o helicóptero pousou e o piloto conta ter sido o único que não desembarcou.

Houve uma conversa, de cerca de dois minutos, com muitos gestos e falas ao pé do ouvido. Enquanto cinco dos tripulantes entraram na mata da região, 'Cabelo Duro' voltou ao helicóptero e deu ordens para voltar à Fortaleza, pegar as malas e ir ao heliponto abandonado na Praia do Futuro buscar dois amigos para uma "reunião secreta".

Felipe teria sido orientado a não desligar o helicóptero quando voltassem à reserva indígena, uma vez que a reunião seria muito rápida. "Vocês não vão fazer nada de errado não, né?", teria questionado o piloto a 'Cabelo Duro', que este teria pedido apenas confiança.

O crime

Quando 'Gegê' e 'Paca' entraram na aeronave, o piloto percebeu que eram as mesmas pessoas que ele havia deixado em Aracati, em setembro do ano passado. À época, Felipe diz que não os conhecia, mas pesquisou na internet e quem seriam e descobriu suas identidades.

As vítimas entraram na aeronave, cumprimentaram 'Cabelo Duro' e elogiaram as qualidades do helicóptero. Já com a máquina no ar, 'Cabelo Duro' havia dito a 'Gegê' e 'Paca' que eles iriam parar em um sítio para pegar galões de combustível. O piloto diz ter estranhado a divergência entre as versões.

Quando pousaram, Felipe revela não ter visto nenhum dos homens que havia deixado anteriormente lá. Wagner teria desembarcado, andado em direção ao matagal, mas não havia entrado "como se estivesse chamando alguém".

Nesse momento, 'Gegê' e 'Paca' perceberam que havia algo diferente e indagaram ao piloto sobre os galões. De repente, os executores teriam saído do matagal, ao comando de Wagner, e abordado os líderes da facção. O helicóptero foi cercado pelos seis. À frente da aeronave, Wagner teria apontado a arma na direção de 'Paca'. Ao lado deste, 'Gegê' teria visto Tiago indo em sua direção com uma arma em punho. Um dos suspeitos abriu a porta da aeronave e puxou 'Gegê' para fora; depois seria a vez de 'Paca'.

Os maiores líderes do PCC em liberdade teriam sido calados pelos disparos da arma de Wagner Ferreira. O piloto contou cerca de dez tiros, mas não soube precisar de quem partiram, além da arma de 'Cabelo Duro'.

Em segundos, Rogério de Simone e Fabiano Souza foram puxados pelos pés em direção ao matagal. Marcas de sangue forjaram o caminho na grama e na areia. De onde estava, Felipe disse não ter conseguido ver o que foi feito com 'Gegê' e 'Paca' atrás das árvores, mas revelou ter visto uma fumaça branca, como se tivessem ateado fogo.

Após

Todos os executores voltaram à aeronave, enquanto discutiam quem seriam os responsáveis por enterrar os corpos deles e o que seria feito com os pertences. Tiago e Carlenilto teriam reclamado que o plano não havia sido executado da forma certa, mas teriam apoiado a retirada dos pertences e seguido em direção a uma duna, junto a Wagner, em voo comandado pelo piloto.

Dali, Wagner teria dito para o piloto pegar a rota para ir embora. Eles teriam pousado apenas em Santo Antônio do Salto da Onça, no Rio Grande do Norte, para abastecer a aeronave e se livrar dos pertences de 'Gegê' e 'Paca'. No voo entre o Ceará e o Rio Grande do Norte, Wagner teria revelado que tanto ele quanto o piloto estavam marcados para morrer, mas ele havia conseguido reverter a situação.

A ideia inicial da morte dos líderes do PCC seria derrubar a aeronave em pleno voo com uma metralhadora .50, já posicionada para isso. Contudo, teria assumido a responsabilidade para si. O plano, segundo 'Cabelo Duro', teria partido de um criminoso conhecido como 'Veinho'. Segundo ele, 'Gegê' e 'Paca' morreram por "estarem roubando milhões em dinheiro da facção'. Além disso, "eles pretendiam levar ao Paraguai os responsáveis por suporte e logística em Fortaleza". Os executores acusaram os líderes mortos de estarem "promovendo guerras, matando pais de família e não levantavam a bunda de suas cadeiras em suas mansões para irem às favelas a fim de resolver os problemas da facção".

No trajeto, segundo o piloto, todos comemoravam o sucesso do plano e diziam que "daqui pra frente é uma nova era". Os passageiros da aeronave teriam dividido cerca de R$ 50 mil, relógios, cordões e outras joias das vítimas. Wagner teria orientado Felipe a levar o helicóptero para Goiânia. No dia seguinte, Felipe disse ter ido ao Guarujá e ter convidado um homem chamado 'Wesley' para confidenciar os fatos. Amigo de infância e elo entre o piloto e Wagner. O homem, segundo o Felipe, seria piloto da Petrobras que trabalha como rebocador.

Dois dias depois, 'Cabelo Duro' foi morto, em São Paulo. Felipe foi preso, no dia 14 de maio. Os outros ocupantes da aeronave permanecem foragidos. Tiago e Carlenilto são cearenses, mas teriam fugido em direção à Bolívia, depois que a emboscada foi descoberta e eles passaram a ser procurados.

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