Facções compram guerra com Estado por mudanças em presídios
Promessas da nova Pasta de Administração Penitenciária provocaram forte retaliação de organizações criminosas inimigas pelas ruas da Capital e Região Metropolitana. Estado teme que ataques criminosos continuem
As mudanças nos presídios, anunciadas pelo novo titular da Secretaria da Administração Penitenciária (Seap), Luís Mauro Albuquerque, emerge como a principal motivação para a ira das facções criminosas e para a série de ataques que aterrorizou a Capital e a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), que começou na noite da última quarta-feira (2) e se estendeu até ontem.
Conforme fontes da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), as facções Comando Vermelho (CV) e Guardiões do Estado (GDE) orquestraram ações contra o Estado paralelamente e selaram um pacto de não agressão entre elas, enquanto houver embate com o Governo. As duas quadrilhas travam uma guerra por território para o tráfico de drogas, que impulsiona o número de homicídios no Ceará desde 2017.
As informações colhidas pela Inteligência da SSPDS apontam participação direta das duas facções. Os primeiros ônibus foram incendiados nos bairros Edson Queiroz, onde há predominância do CV; e Parque Santa Rosa, onde quem manda no tráfico de entorpecentes é a GDE.
A ordem dentro do Comando Vermelho teria partido de uma liderança da facção no Litoral Leste do Estado, com poder sobre criminosos de Caucaia e do Sul da Capital. O criminoso já foi identificado pela Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), que investiga a série de ataques. Entre as suspeitas sobre a sua autoria está a de que ele determinou a explosão de um viaduto na BR-020, em Caucaia.
O homem está preso na Unidade Prisional Agente Luciano Andrade Lima (antiga CPPL I) e, mesmo no cárcere, foi alvo de um mandado de prisão na Operação Piranji, deflagrada pelo Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) e pela Secretaria da Segurança, para combater a atuação criminosa do braço do CV que ele domina, em 29 de novembro do ano passado. Outros 21 suspeitos foram autuados.
Mudanças
As facções continuaram deixando suas marcas nas ruas, durante o dia. Mas o secretário Luís Mauro Albuquerque não recuou na afirmativa de que reuniria as facções no Sistema Penitenciário cearense, que hoje estão separadas. Ontem mesmo, a Seap começou a redistribuir os internos do Complexo Penitenciário de Itaitinga II, que concentra as Casas de Privação Provisória de Liberdade.
Segundo o presidente do Conselho Penitenciário do Ceará (Copen), advogado Cláudio Justa, o avanço da Pasta começou na CPPL III, que reúne membros da facção Primeiro Comando da Capital (PCC). A chegada dos agentes penitenciários à Unidade, na manhã de ontem, revoltou os presos, que se rebelaram para não voltarem às celas. Após controlarem a situação, servidores da Seap realizaram uma varredura de ilícitos e o levantamento de informações sobre cada preso – o que teria ocorrido sem ser informado à SSPDS.
O levantamento serve para definir o destino do detento. “Eles estão separando presos condenados de provisórios. E misturando, independente de facções. CPPLs para provisórios, outras grandes unidades para condenados. A mesma lógica acontecerá nas cadeias públicas”, revela Justa.
A reunião de criminosos inimigos preocupa as organizações e os familiares dos internos, que protestaram na frente do presídio para pedir por segurança e dignidade, na tarde de ontem. O presidente do Copen considera que a medida tomada pelo novo secretário vai de acordo com a Legislação, mas foi anunciada de uma forma imprudente, colocando a população em risco.
Um agente penitenciário do Rio Grande do Norte – onde Luís Mauro comandava a Secretaria da Justiça – contou à reportagem que o policial civil de formação também implantou mudanças drásticas no tratamento às facções, naquele Estado, quando assumiu a Pasta, o que também causou revolta dos detentos e retaliação nas ruas.
Reuniões
A SSPDS tem a informação de que os ataques criminosos não vão cessar tão cedo e, por isso, o Governo pediu apoio de forças federais. No Estado, as polícias Civil e Militar realizaram reuniões extraordinárias – sem a presença do secretário André Costa – para combater a ousadia e o poderio das facções.
A reportagem apurou que a Polícia Civil, sob o comando do novo delegado-geral Marcus Vinícius Rattacaso, definiu uma escala de emergência para aumentar o efetivo das delegacias, durante a noite de ontem e a madrugada de hoje, para evitar ataques aos prédios da Instituição. Já a PM, com o coronel Alexandre Ávila no Comando Geral, garantiu a escolta de ônibus durante a madrugada.