Destino da Segurança Pública Nacional afeta o Ceará

O território cearense se encontra em uma posição estratégica para o tráfico internacional de drogas, o que despertou o interesse das facções criminosas nos últimos anos. O Centro de Inteligência da PF foi prometido para o Estado

Escrito por Messias Borges ,

A nova gestão da Segurança Pública Nacional, que integrará o Governo eleito hoje, interessa diretamente ao Ceará. O Estado, que se encontra em uma posição estratégica para o tráfico internacional de drogas, viu intensificar a presença de facções criminosas nos últimos anos e, por consequência, receberá investimentos dos governos Federal e Estadual no combate à criminalidade.

Especialistas reforçam a importância de o novo Governo Federal dar continuidade a uma política de Segurança Pública que atenda todo o País e iniba o fluxo de criminosos e ilícitos entre os estados. O Ceará é um dos alvos emergentes do crime organizado, o que atrai líderes de facções, entorpecentes e armas de fogo. O maior exemplo disso, que impressionou sociedade e a Polícia, foi o assassinato de dois líderes da maior organização criminosa nacional, o Primeiro Comando da Capital (PCC) - Rogério Jeremias de Simone, o 'Gegê do Mangue', e Fabiano Alves de Souza, o 'Paca' - em Aquiraz, em fevereiro deste ano. A dupla se instalou em território cearense em setembro de 2017 e levava vida luxuosa, junto da família, sem ser notada pelas autoridades.

"Falta um pacto federativo com relação à área de Segurança, envolvendo União, estados e municípios. Primeira coisa, passaria por uma discussão sobre o controle das fronteiras. A outra questão é a dimensão do controle das facções. As facções ficam circulando e sendo criadas em alguns Estados - como é o caso do Ceará, com a Guardiões do Estado (GDE)", analisa o coordenador do Laboratório de Estudo da Violência (LEV), da Universidade Federal do Ceará, sociólogo César Barreira.

O coordenador do Fórum de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil - Secção Ceará (OAB-CE) e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), advogado Laécio Noronha Xavier, afirma que o combate à violência ficou por muito tempo sendo uma obrigação exclusiva dos governos estaduais. "O ator maior era e ainda é o Estado, mas esse processo está se descortinando. Mesmo com toda a impopularidade do Governo Temer, o próximo presidente vai pegar um legado, que é a lei do Sistema Único de Segurança Pública (Susp) e uma política nacional de Segurança Pública. A falta desse padrão nacional, juntamente com a organização das facções no Brasil - já são 84, segundo a Polícia Federal - fez aumentar a criminalidade".

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Fronteiras

A maioria das armas e das drogas utilizadas no Ceará não é produzida no País e passa pelas fronteiras. O Ministério da Segurança Pública foi criado através de Medida Provisória (MP) em fevereiro deste ano e teve a lei sancionada em julho último. O ministro Raul Jungmann revelou, em seguida, que o combate ao crime organizado nas fronteiras seria a prioridade da Pasta.

"Nós temos 8 mil quilômetros de fronteira. É difícil fazer uma atuação que iniba por completo o tráfico, pois temos a maconha vindo do Paraguai, a cocaína vindo da Bolívia, do Peru e da Colômbia. É um esquema empresarial extremamente sofisticado, que chega por avião, carro e até submarinos", conta Laécio Xavier.

Culpar o Governo Federal pela violência é uma tônica do discurso do governador reeleito Camilo Santana e do secretário da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), André Costa. Porém, o Estado também tem parte da responsabilidade na insegurança, conforme sociólogo César Barreira: "Nós não devemos transferir a culpa de toda a situação que vivenciamos para esse dado externo. O Ceará sempre aparece nos rankings (de violência) como primeiro, segundo ou terceiro colocado, o que é muito negativo. O número de homicídios é muito grande e nos coloca em vulnerabilidade".

O Estado cearense registrou mais de 5 mil homicídios em 2017. Este ano começou ainda mais assustador: 35 mortes em quatro chacinas - sendo quatro vítimas no crime ocorrido em Maranguape; 14 mortes na maior matança da história local, no bairro Cajazeiras, em Fortaleza; dez na Cadeia Pública de Itapajé; e sete no bairro Benfica, na Capital.

Todos os casos têm envolvimento de organizações criminosas, sejam interestaduais ou locais. Laécio afirma que as facções estão em todo o País, mas têm se empenhado na atuação no Ceará. "É o Estado mais próximo da África, do Caribe, dos Estados Unidos, da Europa. (No Ceará) Temos um aumento expressivo de drogas apreendidas tanto por terra, como nos próprios aeroportos", completa.

Com pico de homicídios, o Governo Estadual procurou ajuda externa e anunciou investimentos em Inteligência, com a criação da Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública (Supesp), já em funcionamento; e do Laboratório Integrado de Segurança Pública (Lisp), previsto para 2020. O Ministério da Segurança Pública definiu, então, que o Centro Regional de Inteligência da PF do Nordeste será instalado no Ceará, com recursos federais.

O Centro de Inteligência é uma preocupação particular do Estado. André Costa confirmou, em entrevista exclusiva ao Sistema Verdes Mares, que não havia previsão para o aporte federal e que o equipamento chegou a estar na berlinda. Dias depois, Jugmann garantiu que a verba será repassada ainda neste ano e o prédio deve estar pronto no início de 2019. No meio do caminho, entretanto, há a posse de um novo Governo.

Soluções

Para enfrentar o poderio das organizações criminosas, o sociólogo César Barreira acredita que os governos precisam investir mais em Inteligência: "Quanto às facções, não resolveremos com mais violência. Temos que ter um controle científico, mais racional. O bom resultado vai se dar na medida que tivermos órgãos de Segurança Pública utilizando de toda a técnica que já existe, com Inteligência".

Já o advogado Laécio Noronha Xavier suscita o debate da legalização da droga para diminuir a criminalidade no País e, consequentemente, no Ceará: "É preciso repensar uma política nacional de drogas. O proibicionismo não dá certo no Brasil, nos Estados Unidos, em canto nenhum. Porque proibir não quer dizer que não vai haver demanda. No Uruguai e no Canadá, você pode ter a posse da droga e comprar em farmácia. Você sai da seara da Segurança Pública e entra na seara da Saúde".

A SSPDS foi demandada para falar sobre o assunto, mas não respondeu até o fechamento desta matéria.

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