Pais tentam emplacar candidaturas de filhos

Arranjos eleitorais evidenciam, em alguns casos, ausência de ideologia e prevalência de interesses familiares

Escrito por Redação ,
Legenda: Filiação do advogado Eduardo Bismarck (ao centro), filho do prefeito de Aracati, Bismarck Maia, ao PDT ocorreu no fim de dezembro. Outros pais políticos também têm tentado viabilizar as postulações dos filhos ao Legislativo
Foto: Foto: Thiago Gadelha

Sob as bênçãos dos patriarcas, filhos de políticos com trajetória consolidada no Ceará já foram ou estão sendo lançados pré-candidatos às eleições deste ano. Em alguns casos, a oficialização das intenções de postulações - pela legislação, é proibido declarar-se candidato fora do calendário eleitoral - é acompanhada de arranjos eleitorais que incluem mudanças de partidos, para que fique garantido aos novatos um espaço em chapas competitivas na disputa por vagas, sejam de deputado estadual ou federal.

As negociações para isso, que são celebradas como caminho para a "renovação" das siglas, contudo, também perpetuam práticas criticadas no próprio meio político. O troca-troca de partidos, afinal, evidencia uma ausência de ideologia que é motivada prioritariamente por interesses familiares, uma vez que os pais atuam para manter os seus em espaços de poder.

No fim de 2017, mais um caso de pai político lançando pré-candidatura do filho para o pleito deste ano levantou tais questionamentos. O advogado Eduardo Bismarck, filho do atual prefeito de Aracati e ex-deputado federal, Bismarck Maia, filiou-se ao PDT em ato realizado na sede do partido em Fortaleza no dia 20 de dezembro. Na ocasião, ele também foi oficialmente alçado à condição de pré-candidato a deputado federal, sob os olhares e discursos de apoio de lideranças pedetistas no Estado e aliados do município onde a família tem influência política.

Estiveram no ato de filiação o presidente estadual da sigla, deputado federal André Figueiredo, o presidente da Assembleia Legislativa, Zezinho Albuquerque, o prefeito da Capital, Roberto Cláudio, e o presidente da Câmara Municipal de Fortaleza, Salmito Filho, além de outros parlamentares e correligionários. Muitos destes, inclusive, também têm dado demonstrações públicas de apoio a pré-candidaturas de outros filhos de aliados. Herdeiro de Zezinho Albuquerque, Antônio José, por exemplo, pode disputar vaga no Legislativo pelo PP. Já o filho do vice-prefeito de Fortaleza, Moroni Torgan, é pré-candidato a deputado federal pelo DEM e tem o apoio de Roberto Cláudio.

Arranjos no bloco

Na filiação de Eduardo Bismarck ao PDT, era evidente a participação do pai. Antes do evento começar, Bismarck Maia, em clima de confraternização com aliados, arrumava os microfones sobre a mesa do local enquanto dava as últimas orientações ao filho, que dali a alguns instantes conduziria o ato. O ingresso de Eduardo no PDT, que o pai destacou, em vários momentos daquela noite, como apadrinhado pelo ex-governador Cid Gomes, foi resultado de arranjos eleitorais no grupo governista. Afinal, Bismarck Maia está no PTB, mas Eduardo optou pelo PDT para disputar a eleição do ano que vem.

O motivo, segundo ele, é a identificação com bandeiras defendidas pela sigla e com o grupo político dos irmãos Ferreira Gomes, que a comanda hoje no Estado. Além disso, porém, o PTB não mostrou-se uma boa agremiação para recebê-lo, já que Pedro Augusto Bezerra, filho do presidente estadual da legenda, o prefeito de Juazeiro do Norte, Arnon Bezerra, também já foi lançado pré-candidato a uma cadeira na Câmara dos Deputados.

Pedro Augusto, aliás, já tem percorrido municípios com o pai para capitanear apoio para o pleito de 2018 e ocupa grande parte do espaço reservado à propaganda partidária do PTB no rádio e na televisão. Na disputa velada por espaço para os filhos, prevaleceu, no PTB, a força de Arnon, que comanda o partido.

Em Aquiraz, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), o prefeito Edson Sá (PMDB) também quer lançar o filho, Rafael Sá, candidato a deputado. Para isso, empossou o rebento como secretário municipal e, juntos, os dois têm circulado por eventos da gestão. Já na Capital, o filho do vice-prefeito, o ex-deputado federal Moroni Torgan, assumiu, em janeiro do ano passado, o comando da Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Fortaleza. O advogado Mosiah Torgan tem o apoio do prefeito Roberto Cláudio.

Há ainda, no rol dos herdeiros que tentam ser alçados ao Legislativo, o titular da Secretaria Regional VI de Fortaleza, Antônio José, filho do presidente da Assembleia, Zezinho Albuquerque, além do filho do senador e presidente do Congresso Nacional, Eunício Oliveira (PMDB), o engenheiro civil Rodrigo Oliveira. Antônio José já foi prefeito de Massapê, município onde o pai tem influência eleitoral, e atualmente é presidente estadual do PP. Ele é o único, dentre os filhos de políticos colocados como pré-candidatos até agora, seja em manifestações públicas ou em conversas de bastidores, que já ocupou mandato eletivo.

O retrospecto da curta trajetória política de alguns pré-candidatos mostra que, até o momento, suas escolhas partidárias refletem interesses de família. Em 2014 no PROS, partido que, àquela época, abrigava os Ferreira Gomes no Ceará e também Bismarck Maia, Eduardo Bismarck, por exemplo, chegou a lançar-se postulante ao cargo de deputado estadual, mas retirou a candidatura antes do pleito. Já em 2016, foi para o PPS para, com o comando da sigla em Aracati, fortalecer a coligação do pai, que foi eleito prefeito. Agora no PDT, contudo, ele defende que há uma identificação ideológica com a legenda.

Ideologia

"Quando estava no PROS, boa parte do grupo político a que pertencia também estava no PROS, que é o grupo político que me identifico. A minha passagem pelo PPS, querendo ou não, teve uma ligação também com a eleição do meu pai em Aracati, em que pese, também, que o PPS tem uma história de luta muito forte, é um partido socialista; e o PDT eu acho que, pela tradição, pela coerência, pelo trabalho que o PDT faz no País, eu tenho uma identidade muito maior com esse partido", justificou.

O pai dele, Bismarck Maia, por outro lado, admite que práticas comuns à maioria dos partidos atualmente, inclusive as trocas frequentes com interesses eleitorais, agravam a crise política na qual está mergulhado o País. "Reconheço de forma geral, e não pontual, que nós estamos no fundo do poço nessa questão partidária. Não tem condição de um País conviver com 36 partidos e deixar essa discussão. Nós temos é que fortalecer o partido, temos que discutir a questão do voto distrital misto".

Embora não como uma autocrítica, ele diz que faltam, à maioria dos partidos brasileiros, discussões de base, o que contribui para a recorrente dança das cadeiras às vésperas das eleições. "A que leva isso? Você ficar alternando para lá e para cá de acordo com os seus interesses de se eleger. Não existe isso. Até para ter uma colocação dentro do partido você deveria ter uma discussão interna, fazer militância, por isso acho às vezes que o voto distrital é muito importante, porque você vai disputar dentro do partido, passo a passo, o seu espaço político, e aí você tem que militar, ir segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado e domingo para as bases, construir delegados, para com os delegados você ter um número que possa lhe favorecer na disputa por uma vaga de candidatura pra deputado, vereador, prefeito etc", defendeu.

Perguntado sobre qual foi o seu papel na negociação para o ingresso do filho no PDT, Bismarck Maia diz que tentou orientá-lo como pai e político, mas ressalta que a decisão foi de Eduardo Bismarck, que construiu, nos últimos anos, relação de proximidade com Cid Gomes. Ele foi advogado do ex-governador em alguns processos, como na ação movida pelo ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), após Cid, quando ministro da Educação, ter chamado, no plenário daquela Casa, deputados de "achacadores".

Interesse

Como prefeito de Aracati, porém, o pai frisa que um deputado federal que represente o município em Brasília pode garantir benfeitorias à região. "Estou continuando na vida política como prefeito agora, já tive a oportunidade de estar em várias funções, e gostaria muito de ter um deputado federal que pudesse nos ajudar nesse projeto de mudanças lá no Aracati", destacou.

Ao tratar das conversas para a filiação de Eduardo Bismarck ao PDT, o presidente estadual da sigla, André Figueiredo, minimizou que o fato de o filho de Arnon Bezerra já ser pré-candidato do PTB tenha interferido na escolha pelo partido. "Na nominata, o PTB não vai poder sair sozinho, então talvez venha a se coligar conosco também. Isso é tudo para ser discutido em 2018", ponderou o dirigente.

O prefeito Bismarck Maia, por sua vez, ressalta que a situação no PTB não foi determinante para a definição do filho, mas teve participação na mudança de partido. "Foram levadas em consideração as raízes trabalhistas. Agora, com relação ao PTB, lógico que o presidente Arnon, tendo em vista eu estar no PTB, queria e gostaria que o Eduardo fosse (candidato pelo partido), agora existe uma expectativa muito grande de uma coligação. O Arnon está junto do projeto do governador Camilo, do Cid, e não é de hoje, é desde a eleição passada, e quero crer que vamos marchar juntos. Agora, essa escolha é dele, é do Cid com ele".

Famílias no poder

Bismarck Maia, prefeito de Aracati e ex-deputado federal, já lançou a pré-candidatura do filho, o advogado Eduardo Bismarck, à Câmara dos Deputados;

Zezinho Albuquerque, presidente da Assembleia Legislativa, deve tentar viabilizar o nome do filho, Antônio José, a uma vaga no Legislativo;

Arnon Bezerra, prefeito de Juazeiro do Norte, já fortalece a imagem do filho, Pedro Augusto, em municípios do Interior e na propaganda partidária do PTB;

Moroni Torgan tem o apoio de Roberto Cláudio para que o filho, Mosiah Torgan, chegue à Câmara;

Edson Sá, prefeito de Aquiraz, nomeou o filho, Rafael Sá, como secretário municipal e busca viabilizar sua candidatura;

Eunício Oliveira, presidente do Senado, dá sinais de que tentará eleger o filho Rodrigo Oliveira para o cargo de deputado federal.

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