Presença de militares quer dar nova imagem de gestão ao Governo Bolsonaro

Jair Bolsonaro é o presidente que mais indicou membros das Forças Armadas para compor o Governo Federal desde a redemocratização. Especialistas em administração pública e cientistas políticos discutem que implicações isso tem tido no início do mandato do governante do PSL

Escrito por Letícia Lima ,

A presença de oficiais das Forças Armadas em postos-chaves do Governo Federal tem sido uma marca do presidente Jair Bolsonaro (PSL). Primeiro que ele, ocupante do cargo mais alto da República, é um capitão do Exército. Ainda no topo da hierarquia também está outro oficial, o general Hamilton Mourão, escolhido para ser vice-presidente. No primeiro escalão, Bolsonaro também não abriu mão de indicar outros colegas: sete dos 22 ministros são militares, o que reflete a imagem da gestão que quer construir o Planalto.

É a primeira vez, desde a redemocratização do Brasil, que um número tão expressivo de membros das Forças Armadas ocupa o alto escalão. Interlocutores do governo defendem que as indicações são técnicas e não políticas, reforçando uma das principais bandeiras da campanha de Bolsonaro: o combate à corrupção. 

Especialistas em administração entrevistados pelo Diário do Nordeste apostam no perfil de gestão que os militares poderão dar ao serviço público. Cientistas políticos ressaltam o ar de ordem e disciplina que o governo quer passar com a participação maior das Forças Armadas nas instâncias de poder, mas preferem esperar os efeitos práticos dessas escolhas na resolução de problemas do País. 

Em outros governos

O fato é que, até agora, pelo menos 20 oficiais, sejam da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, foram nomeados para cargos importantes do Governo de Jair Bolsonaro. Na gestão anterior, do ex-presidente Michel Temer (MDB), eram sete militares no Governo Federal. Nos governos dos ex-presidentes petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, a relação com as Forças Armadas também era vista como amistosa.

Mas, conforme ressalta o professor de Ciências Políticas da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Jorge Almeida, o prestígio de oficiais no governo vem de antes.
“Eles tiveram crescentemente poder de veto sobre determinadas questões. Nenhuma Reforma da Previdência atingiu militares. Em relação a algumas posições políticas, sobre a possibilidade de não condenação de Lula, houve declarações públicas do general Villas Boas. Depois, eu acho que os militares também se inserem dentro de uma tradição da diplomacia brasileira, que impediu posições de submissão mais deslavadas em relação ao governo dos Estados Unidos”, exemplificou. 

O especialista em Administração da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) considera que, por causa da experiência na carreira militar, os oficiais poderão dar um tom mais técnico ao Governo Federal. “Porque um militar que chega na alta patente esteve na responsabilidade da segurança nacional. A carreira militar, hoje, é um dos serviços públicos de formação de quadros, aptos para responder pelo serviço público”. 

Por outro lado, Álvaro admite temer uma politização da instituição militar. “Meu único temor é de uma aproximação dos militares com a política, mesmo tendo militares que já estão na reserva. Penso que as instituições públicas têm que primar pela neutralidade política, mas também penso que a gente vai verificar isso no futuro. É um risco em potencial”, avalia.

Ordem na casa

Já o cientista político Aninho Mucundramo Irachande, professor da Universidade de Brasília (UNB), acredita que é cedo para dizer se os militares são melhores administradores que civis. Ele lembra que já ocorreram escândalos em pastas comandas por militares e que a eficiência das Forças Armadas já foi colocada em xeque, como na intervenção federal decretada no ano passado no Rio de Janeiro.

“Acho que o presidente Bolsonaro não escolheu os militares convencido de que são os melhores gestores, ele escolheu porque acha que podem impor algum tipo de disciplina, que podem ter algum alinhamento de interesses com a ala militar que está no governo. Não há evidências que teremos uma gestão melhor ou pior, a partir do fato deles serem apenas militares. Pode ocorrer que um ou outro seja bom e possa transferir isso para o êxito do Governo Bolsonaro, mas pode acontecer o contrário”, analisa. 

O professor Aninho Mucundramo não vê problemas em ampliar a presença de militares na gestão pública, desde que essa “política” não seja adotada apenas para marcar uma posição contrária a alinhamentos ideológicos no Governo Federal. 

“Os militares que estão no Governo Bolsonaro são alinhados a uma ala que, de alguma forma, têm relação com o Bolsonaro. Ele, Bolsonaro, foi discípulo do general Heleno, mas o general já esteve em governos passados, trabalhou no governo do Fernando Henrique Cardoso. Então eu vejo como problemático quando o sentido da escolha é porque eles se opõem a uma ideologia que ele acredita que não é o melhor para o Brasil e os problemas do País”, opina. 

Militares no primeiro escalão

Presidência:
Capitão do Exército Jair Bolsonaro 

Vice-presidência:
General do Exército Hamilton Mourão 

Ministério da Secretaria de Governo:
General do Exército Carlos Alberto dos Santos Cruz 

Ministério de Minas e Energia:
Almirante de esquadra da Marinha Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Junior*

Ministério da Ciência e Tecnologia:
Tenente-Coronel da Aeronáutica Marcos Pontes

Ministério da Defesa:
General do Exército Fernando Azevedo e Silva

Ministério da Transparência:
Capitão do Exército Wagner Rosário

Gabinete de Segurança Institucional:
General do Exército Augusto Heleno

Ministério da Infraestrutura:
Capitão do Exército Tarcísio de Freitas 

*Está na ativa, os demais estão na reserva.

Militares no segundo escalão

Porta-voz do governo:
General de divisão Otávio Santana do Rêgo Barros

Secretaria Nacional de Segurança Pública:
General Guilherme Theophilo

Secretaria de Esportes:
General Marco Aurélio Costa Vieira

Secretaria de Transporte Terrestre e Aquaviário: 
General Jamil Megid Júnior 

Secretaria-Geral do Ministério da Defesa:
Almirante de Esquadra Almir Garnier Santos 

Secretaria-Executiva do Gabinete de Segurança Institucional:
General Valério Stumpf Trindade

Secretaria-Executiva da Secretaria Geral da Presidência:
General Floriano Peixoto Vieira Neto 

Diretoria-geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT):
General Antônio Leite dos Santos Filho 

Presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai):
General Franklimberg Ribeiro de Freitas 

Petrobras:
Comandante da Marinha Eduardo Bacellar Leal Ferreira (presidência do Conselho)

Caixa Econômica:
Brigadeiro Mozart Farias (assessoria da presidência) 

Secretaria Especial da Receita Federal:
General José Carlos Nader Motta

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