Nardes defende novas regras de governança

Em evento na Capital, ele avaliou que, sem uma política de governança, o Brasil entrará em colapso

Escrito por Redação ,
Caso não adote regras adequadas de governança, o Brasil corre o risco de viver, em nível nacional, a crise pela qual já passa o Estado do Rio de Janeiro. É o que pensa Augusto Nardes, ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), que participou ontem, na Capital, do último dia do 1º Fórum Brasileiro de Governança nas Contratações Públicas, realizado na Câmara Municipal de Fortaleza pela Editora Fórum. “Independentemente de quem seja eleito, se não implementar a política de governança, o Brasil entra em colapso. E, de certa forma, já estamos”, analisou o magistrado. 

De acordo com ele, a ausência de medidas para aumentar a eficiência do setor público já tem tido efeitos deletérios em Estados ricos do País, como Minas Gerais e Rio Grande do Sul, além do Rio de Janeiro. O Ceará, entretanto, foi destacado pelo ministro do TCU como um bom exemplo. “Está em uma situação bem diferente porque fez intervenções lá atrás, mas há Estados em situações caóticas”, comparou. 

Segundo Augusto Nardes, grande parte dos problemas enfrentados pelo País advém da dificuldade de organização da máquina pública. Como exemplo, ele citou deficiências na organização das fronteiras, que custam anualmente aos cofres públicos pelo menos R$150 bilhões em razão de impostos que deixam de ser recolhidos com contrabando, como o de cigarros, além da entrada de drogas e armamento no País. “Não temos organização da fronteira e, como consequência, não temos controle da segurança do Brasil, porque o País está desarmado, mas os traficantes não”.

Em entrevista, o ministro ressaltou que uma das maiores dificuldades para a implantação de um projeto de governança no Brasil é a compreensão do que seria o projeto. “É um processo lento fazer as pessoas entenderem que a administração pública não pode ser feita apenas no instinto. É preciso organizar, ter planejamento”, sustentou. De acordo com ele, porém, isso já começou a ser revertido, e vários órgãos públicos têm melhorado a governança de pessoas, materiais e compras. “O Ministério do Planejamento vai começar a implementar essas medidas. Já pediram uma reunião conosco. Isso está acontecendo em todo o Executivo”, mencionou. 

Augusto Nardes também destacou que já há sinalizações de interesse para a implementação de medidas de governança por parte do Judiciário e do Legislativo. Ele disse que o objetivo do TCU é, ao longo do ano, ao menos “divulgar a ideia, para que o novo presidente eleito estabeleça uma política de governança melhor para a Nação brasileira”.

Regras atuais

Nardes, entretanto, afirmou que há também quem tenha interesse na manutenção de regras de governança atuais. “Muitas vezes, as pessoas querem concentrar muito poder na mão e não querem a transparência necessária, e a política de governança exige transparência, integração entre as instituições, diálogo permanente para que possamos todos trabalhar em conjunto para que não haja uma desarmonia”, declarou. Ele defendeu, porém, que regras de governança são fundamentais para evitar até mesmo ilegalidades. 

“Geralmente, a pessoa que quer comandar sozinha, principalmente na área pública, acaba se dando mal, porque acaba cometendo atos ilegais. Então, a boa governança é também um anteparo para a prevenção, porque monitorar e avaliar são também princípios de governança”, disse o ministro.

Augusto Nardes, que foi relator das contas reprovadas da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) que acabaram levando ao impeachment, considerou que as Cortes de Contas vêm ganhando mais relevância no País. “Foi a primeira vez na história que fizemos um parecer pela reprovação das contas, mas não porque quiséssemos. Alertamos durante três, quatro anos, que a situação era difícil, mas, infelizmente, não foram tomadas medidas”, justificou o magistrado. 

De acordo com ele, o ato da petista não foi praticado sem consequência, portanto, a decisão do TCU foi importante “para a Nação e proteger o Estado”. “Gerou queda de quase R$2 trilhões no PIB, trazendo prejuízo imenso para toda a estrutura do Estado”, disse.

Também presente ao evento, o ministro do TCU Benjamin Zymler, por sua vez, defendeu que boas regras de governança da atividade pública são necessárias, porém não suficientes para evitar problemas com corrupção. Para ele, “a melhoria da eficiência do Estado brasileiro é, sem sombra de dúvida, mais complexa do que isso”. 

Corrupção

O ministro avaliou que a crise política pela qual passa o País tem múltiplas razões, e melhoras na forma como se administra a coisa pública com certeza ajudam, mas não solucionam todo o problema. Segundo Benjamin Zymler, as regras de governança geralmente se referem a questões administrativas, que, por sua vez, são voltadas para objetivos determinados pelos agentes políticos do País. 

“Quando você tem essa deficiência a priori, com pessoas que estão eventualmente em cargos públicos para obter outros fins que não o bem comum, é muito difícil criar uma estrutura da administração pública suficiente e capaz para evitar esse sistema de corrupção”, declarou o magistrado. É por isso que um dos princípios da governança, de acordo com ele, é justamente a liderança. “Ela pressupõe pessoas íntegras, capazes, qualificadas. Se, eventualmente, você tem órgãos (públicos) cujos diretores, dirigentes, presidentes são indicados já com visão deturpada dos seus objetivos, não há como falar de governança”, explicou.

Estatal

Como exemplo, o ministro citou a crise na Petrobras. “O melhor sistema licitatório não teria sido capaz de evitar a corrupção na Petrobras, porque havia uma arquitetura que permeava o sistema político, econômico, as empresas e a diretoria da estatal”, analisou. A empresa estatal, de acordo com ele, possui, inclusive, um sistema de governança razoável. 

Zymler, entretanto, destacou que boas regras de governança dificultariam a ação de corruptores e corruptos, dando alguma blindagem contra eventuais pressões daqueles com intenção de realizar desvios, embora não sejam suficientes para coibir ilicitudes. “O Brasil precisa, necessariamente, passar por uma revisão do seu sistema político”, defendeu. Apesar disso, ele frisou que a governança “é algo muito simbólico que tem que ser preservado para melhorar a eficácia da administração pública”.

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