Grito milenar não ecoa nas urnas

Candidaturas indígenas enfrentam barreiras. Hoje (7), 5.253 eleitores votarão em 30 seções especiais indígenas instaladas pela Justiça Eleitoral em 15 municípios do Ceará. Ser votado, apesar de direito, ainda é desafio para índios candidatos, com pouca estrutura de campanha

Escrito por Letícia Lima ,

Da relação de 915 pedidos de registro de candidatura feitos ao Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE) para as eleições deste ano, apenas dez (1,09%) são de indígenas. No País, são 133 dentre as mais de 29 mil solicitações de candidatura. O pouco espaço que a maioria dos partidos dá para tais candidatos também fica evidente no repasse de recursos. Quatro dos dez indígenas que estão nas urnas do Ceará, hoje, não receberam um centavo para a campanha.

Dos 35 partidos registrados na Justiça Eleitoral, o PSOL é o que apresentou maior quantidade de candidatos indígenas - 26 - no País, seguido pelo PT, com 14 pedidos de registro. A maioria concorre ao cargo de deputado estadual, enquanto apenas 14 disputam cargos majoritários. No Ceará, Francisco Gonzaga (PSTU), candidato ao Governo do Estado, é o único na eleição majoritária que se declara indígena.

Jarbas (PCdoB), que pleiteia uma vaga na Assembleia Legislativa, embora não conheça a sua origem, detalhadamente, se identifica como indígena pelo biotipo. Sem recursos do partido, ele recebeu apenas material de propaganda, como panfletos e adesivos, e destinou R$ 1.500 do próprio bolso para a campanha. "O Ceará ficou um pouco abafado (quanto às demandas da população indígena), não há uma política para eles", cita.

Também candidata a deputada estadual, Alice Ribeiro (PT) diz que tem uma relação "profunda" com a população indígena, por ter avô tupi-guarani e também por já ter morado na comunidade Jenipapo-Kanindé, em Aquiraz.

Fazer a diferença

Alice recebeu R$ 42,5 mil do PT. Para ela, porém, o recurso é insuficiente. "Receber o que é referente à cota dos 30% para candidaturas femininas sem dúvida é muito bom, mas não é suficiente pra ter pernas para caminhar, para desenvolver o trabalho que seria ideal. E aí a gente utiliza a nossa criatividade e a nossa vontade de fazer a diferença".

Na disputa presidencial, apenas dois candidatos se declaram indígenas: Sônia Guajajara (PSOL), candidata a vice de Guilherme Boulos (PSOL), e general Mourão (PRTB), candidato a vice de Jair Bolsonaro (PSL). Sônia sustenta que sua candidatura representa a luta de um povo que "sempre esteve à margem desse processo da política institucional". Para ela, os partidos não só negam a representação indígena, mas também a diversidade.

"Primeiro, antes dos partidos, é preciso a sociedade aceitar que tem indígena no Brasil, porque a gente ainda é um povo muito invisibilizado. São 1.518 anos desde a invasão europeia e nós, povos indígenas, mesmo sendo os povos originários, somos desconhecidos dentro do nosso próprio País, e a sociedade não reconhece e não respeita a diversidade de povos que existem aqui".

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