Divergências entre Bolsonaro e Camilo sinalizam difícil relação

Ainda sem um canal direto de diálogo com a Presidência da República, o governador precisou recorrer à institucionalidade para receber ajuda federal no combate ao crime. Disputa política foi exposta em guerra de declarações.

Escrito por Inácio Aguiar e Wagner Mendes ,

A crise na Segurança Pública que aflige o Ceará há três dias expôs as rotas opostas entre presidente Jair Bolsonaro (PSL) e o governador Camilo Santana (PT). Ontem, o presidente fez questão de destacar posição política "radical" do petista contra ele. Já Camilo respondeu alertando que a "eleição já passou" e pedindo "cooperação" para solucionar a crise.

Em entrevista coletiva, na tarde de ontem, Bolsonaro afirmou que tem conversado de forma intensa com o ministro da Justiça, Sergio Moro, para tratar dos ataques de autoria das facções criminosas que acometem o Ceará.

O presidente elogiou o ex-juiz e alfinetou o governador do PT: "Ele (Moro) foi muito hábil, rápido e eficaz para atender, inclusive, a um Estado cujo governador reeleito é oposição radical a nós", disse.

O ex-capitão declarou ainda que faltava, por parte do Governo do Ceará, se enquadrar e, via ofício, informar "da real necessidade da Força" pela "incapacidade de resolver o problema" pelo Estado.

O presidente, no entanto, negou que vai agir, como chefe do Palácio do Planalto, fazendo oposição à população que precisa de ajuda. "Nós jamais faremos oposição ao povo de qualquer Estado. E o povo do Ceará precisa nesse momento, tanto é que as medidas já foram tomadas", completou Bolsonaro.

Pegando carona nas críticas do titular da cadeira presidencial, o vice-presidente general Hamilton Mourão (PRTB), em entrevista à imprensa nacional, foi mais incisivo contra o governador cearense. A razão da crise na segurança pública, de acordo com o general, é que Camilo "sempre tratou mal a PM" e que, "pelas informações" que recebeu, "40% do efetivo da Polícia está de férias agora", agravando o momento de desentendimento político entre Estado e União.

Interesses

Em resposta às duas críticas, o governador Camilo Santana enviou nota ao Diário do Nordeste afirmando que "a eleição já passou" e que "os interesses da população do meu estado sempre estarão acima de qualquer interesse pessoal ou partidário".

A nota continua tentando apaziguar os ânimos. "Como homens públicos temos que ser maiores do que qualquer divergência. De minha parte a relação será sempre de respeito e cooperação", diz o petista.

Ex-adversário de Camilo na disputa eleitoral de outubro do ano passado, general Guilherme Theophilo, que é o atual secretário Nacional de Segurança Pública, concedeu entrevista coletiva, em que sinalizou que "só tem mais violência onde há disputa entre facções por território".

A declaração é uma resposta à fala do secretário de Administração Penitenciária do Ceará, Luís Mauro Albuquerque, que afirmou não conhecer a existência das facções que orquestram ataques a prédios públicos e coletivos no Ceará.

Evitando críticas diretas ao governador, o ex-tucano resumiu a onda de ataques às disputas de território.

"Há ainda uma disputa muito grande lá por território, por isso a violência no Ceará está muito grande. Nós tivemos recentemente uma chacina lá em modus operandi nunca antes visto", disse.

Interlocução

As divergências políticas entre Camilo e Bolsonaro já nos primeiros dias do governo dão a dimensão da dificuldade que haverá para a pacificação da relação entre Estado e União necessária aos interesses da sociedade cearense. A primeira crise expõe a necessidade urgente de interlocução para as grandes demandas do Ceará que estão por vir nos próximos quatro anos.

Após a guerra de declarações políticas, cerca de 300 homens da Força Nacional foram enviados ao Ceará ainda ontem para auxiliar o policiamento local diante da crise na Segurança.

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