Dias Toffoli destaca diálogo no 1º discurso à frente do STF

Posse do novo chefe do órgão máximo do Poder Judiciário é marcada pela defesa democrática e da pacificação do País

Escrito por Redação ,
Legenda: Dias Toffoli fez juramento de cumprir a Constituição. Ministro é tido como conciliador
Foto: FOTO: AGÊNCIA BRASIL

Brasília. O novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, 50, destacou o respeito às diferenças e a necessidade do diálogo em seu primeiro pronunciamento à frente do Poder Judiciário, temas presentes nos diversos discursos da cerimônia de posse realizada, ontem, no plenário da Corte. Descrito por colegas como um magistrado de perfil agregador e conciliador, Toffoli deu esse tom a seu discurso, repleto de referências do mundo acadêmico e da cultura pop.

As muitas citações foram da pensadora Hannah Arendt (1906-75) aos compositores Renato Russo (1960-96) e Cazuza (1958-90). Toffoli também fez uma retrospectiva histórica de aspectos jurídicos no Brasil e avançou até o mundo digital, afirmando ser preciso que nos adaptemos às novas realidades.

"Precisamos nos conectar cada vez mais com o outro. Afetividade. Sensibilidade. Empatia. Voluntariado. Gentileza e cordialidade com o próximo. Amor. Viralizar a ideia do mais profundo respeito ao outro, da pluralidade e da convivência harmoniosa de diferentes opiniões, identidades, formas de viver e conviver uns com os outros", disse.

"Plurais são e devem ser os tribunais, com a natural convivência, em seu seio, de juízes com concepções de mundo e de direito diversas. Não é à toa que não só no Brasil, mas nos Estados Unidos e em outras supremas cortes, as principais decisões são proferidas por maioria, e não por unanimidade. Em um colegiado, não existem vencedores e vencidos, nem vitórias ou derrotas", afirmou.

Toffoli conclamou os mais diversos grupos sociais ao diálogo, defendeu o fim de preconceitos e enfatizou o mandamento constitucional de que deve haver harmonia entre os Poderes. "A harmonia e o respeito mútuo entre os Poderes da República são mandamentos constitucionais. Não somos mais nem menos que os outros Poderes. Com eles e ao lado deles, harmoniosamente, servimos à nação brasileira. Por isso, nós, juízes, precisamos ter prudência", afirmou.

Protagonismo

Toffoli assume o comando do STF em um momento de protagonismo do Judiciário, de polarização política e às vésperas de uma eleição presidencial imprevisível. "É dever do Judiciário pacificar os conflitos em tempo socialmente tolerável. Já dizia Cazuza, 'Porque o tempo, o tempo não para'. É a hora e a vez da cultura da pacificação e da harmonização social, do estímulo às soluções consensuais, à mediação e à conciliação".

Conflitos

No início de sua fala, Barroso afirmou que a democracia não é um regime de consenso, mas de resolução das diferenças no plano institucional. E disse que, apesar de às vezes ter visão de mundo diversa da de Toffoli, ambos trabalham para a resolução dos conflitos de modo democrático. No mundo jurídico, Barroso é apontado como "linha-dura" na área criminal, sendo por vezes chamado de punitivista.

Toffoli, por outro lado, é apontado como garantista. Foi dele a iniciativa de, em junho, soltar o ex-ministro José Dirceu, que cumpria pena após ser condenado em 2ª instância na Lava- Jato.

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, também enfatizou em seu discurso a necessidade de se respeitar as divergências. "A autoridade de uma corte é alcançada quando as várias vozes se fazem uma", disse Dodge.

OAB-CE

O advogado e conselheiro federal da OAB-CE, Ricardo Bacelar, lembrou que Toffoli assume a presidência em um "momento delicado" para o Brasil. "Espero que Toffoli fortaleça o papel das instituições para garantir a ordem e paz social. Ele tem uma missão importante pela frente de pacificar o Brasil, cumprir a Constituição e agir com retidão", disse Bacelar.

Sobre a celeridade judicial, defendida pela, agora, ex-presidente da Corte, a ministra Carmen Lúcia, Bacelar afirmou que Toffoli deve continuar com o mesmo projeto em vista da enorme quantidade de processos que "sufocam" o Judiciário. "A justiça não tem dado uma resposta satisfatória, tem que passar por um processo de modernização e gestão mais voltada a celeridade e desburocratização dos processos", observou.

As críticas em torno do papel do STF, de julgar e não legislar, também foram levadas em conta pelo advogado cearense. De acordo com Bacelar, as hierarquias dos Poderes precisam ser respeitadas e nem Judiciário e Executivo devem legislar. "É importante respeitar as hierarquias dos poderes e ter cada um no seu quadrado. Espero que a gente tenha um caminho mais transparente pela frente".

Perfil

Ministro ajudou a delimitar delação premiada no STF

Natural de Marília (SP), Toffoli chega à presidência do STF nove anos após se tornar ministro, nomeado em outubro de 2009 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Sua experiência com o Executivo e o Legislativo lhe rendeu capital político, na avaliação de colegas -atributo que deverá ser útil neste momento de protagonismo do Judiciário. Ele foi advogado-geral da União (2007-09) e subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil (2003-05) nos governos Lula.

Atuou na Prefeitura de São Paulo em 2001 na gestão de Marta Suplicy, então no PT, assessorou a liderança do partido na Câmara dos Deputados(1995-2000). No STF, veio dele a definição de que a delação premiada, se trata apenas de um meio de obtenção de prova, um ponto de partida para a coleta de documentos, e não uma prova em si. O ministro é autor de decisões polêmicas na seara criminal, como a que libertou, em junho, o ex-ministro José Dirceu, que cumpria pena após ter sido condenado em segunda instância na Lava-Jato.

*Colaborou Carolina Curvello