Democracia não está em risco no Brasil, diz Moro

Em palestra realizada em universidade dos EUA, juiz da Lava-Jato defendeu as ações de combate à impunidade

Escrito por Redação ,
Legenda: Responsável pelos processos da Lava-Jato em Curitiba, Moro afirmou que as delações eram a "alternativa possível" diante do histórico de impunidade
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Cambridge. Pouco mais de uma semana após ter ordenado a prisão do ex-presidente Lula, o juiz federal Sérgio Moro afirmou, ontem, que a democracia brasileira não está em risco.

"Vou ser claro: a democracia não está em risco no Brasil. Absolutamente não. O que está acontecendo é a luta pelo Estado de Direito", declarou. "Eu acho que é exatamente o oposto. Ao final, nós teremos uma democracia mais forte, e uma economia ainda mais forte".

Moro pediu licença para fazer um "comentário inicial sobre o que está acontecendo" ao participar de um painel sobre crimes de colarinho branco na Universidade de Harvard, nos EUA.

"É importante dizer algumas coisas, porque o mundo está prestando atenção", comentou, em referência, ainda que não explícita, à recente prisão do líder petista, no último dia 7.

Diante de uma plateia de juízes, procuradores e estudantes de direito brasileiros, o magistrado afirmou que há dois jeitos de encarar a situação do Brasil neste momento: uma, com vergonha. Outra, com orgulho.

"Há alguma razão para estarmos orgulhosos, não de um juiz ou de alguns procuradores, mas do povo brasileiro como um todo", afirmou, lembrando dos protestos contra a corrupção ocorridos nos últimos anos.

O juiz citou ainda um discurso do então presidente americano Theodore Roosevelt, em 1903, que afirmou que "a exposição e punição da corrupção pública é uma honra para uma nação, e não uma desgraça". Moro já havia mencionado o mesmo discurso em um vídeo que divulgou na noite anterior às eleições em 2016. "Eu acho que isso define o que boa parte do povo brasileiro pensa neste momento".

O evento de que Moro participa é organizado pela Harvard Law Brazilian Studies Association. Moro não quis comentar a invasão ao tríplex no Guarujá que é atribuído ao ex-presidente Lula, sob o argumento que poderá ter que se posicionar sobre o episódio nos autos no futuro.

Delações leves

O magistrado ainda reconheceu, durante o painel, que alguns acordos de delação premiada firmados no decorrer da Lava-Jato foram "muito leves" -mas que eram a alternativa possível diante do histórico de impunidade em casos de corrupção. "É preciso levar em conta as condições de negociação dos procuradores", afirmou. "Eu concordo que alguns (acordos) poderiam ter sido mais duros, mas às vezes é difícil".

Moro ainda voltou a defender o fim do foro privilegiado, inclusive para juízes, e declarou ser a favor de uma emenda constitucional para acabar com a ferramenta, que chamou de "um escudo contra a responsabilização". Foi aplaudido pela plateia.

O tema irá voltar a julgamento no Supremo Tribunal Federal no dia 2 de maio.

Perguntado pela imprensa se o fim da prerrogativa de foro não poderia aumentar o risco de influência política no Judiciário, em processos contra prefeitos e vereadores pelo interior do país, o juiz afirmou que toda mudança "tem benefícios e, eventualmente, efeitos colaterais". "Aí precisa de transparência. Você tem o juiz, o promotor, a sociedade civil local".

Foro privilegiado

Também presente no evento, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, também defendeu o fim do foro privilegiado, que violaria o princípio constitucional de que todos são iguais perante a lei.

Para ela, o instituto é um dos elementos que contribuíram para o sistema de corrupção existente no Brasil. Dodge afirmou que a extinção do privilégio aumentará a credibilidade dos juízes de primeira instância.

"Uma das grandes lições da Lava-Jato é que as respostas mais efetivas e firmes contra a corrupção vieram de juízes que estão no primeiro grau da carreira e, não por acaso, dois deles estão aqui neste evento", declarou Dodge, referindo-se a Moro e a Marcelo Bretas, juiz da Lava-Jato no Rio de Janeiro.