Urbanismo tático

A área na Praia de Iracema, onde está localizado o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, é bem conhecida por sua importância para Fortaleza. É uma zona de convergência de iniciativas da economia criativa, indissociável da sua vida cultural. Ao mesmo tempo, o local enfrenta desafios como ordenamento da ocupação do espaço, a presença de ambulantes, a manutenção da segurança pública e a convivência entre pedestres, ciclistas e motoristas de veículos automotores.

Recentemente, uma ação da Prefeitura Municipal de Fortaleza alterou a dinâmica do local e teve bons resultados a olhos vistos. O Projeto Cidade da Gente, apoiado pela Iniciativa Bloomberg de Segurança Viária Global, ampliou seu espaço de uso por pedestres, ciclistas e portadores de necessidades especiais. Planejada, inicialmente, para ser implantada em agosto, a mudança teve impacto no perfil dos frequentadores. A frequência infantil, por exemplo, aumentou.

A interferência foi promovida com recursos simples: tinta de fácil remoção, cones, jarros de plantas, bancos e outros mobiliários de baixo custo. Um trecho da Rua Dragão do Mar, em frente à Escola Porto Iracema das Artes, foi fechado para uso exclusivo de pedestres - com exceção para veículos de carga e descarga. Pintando o chão com cores e formas chamativas, foram ampliadas a área da praça do centro cultural e a calçada da Rua Almirante Jaceguai.

Nesta semana, a Prefeitura anunciou que as mudanças da intervenção temporária seriam incorporadas, em caráter permanente, ao local. É a segunda vez que esse tipo de incorporação se concretiza. A primeira vez aconteceu com a intervenção, realizada no ano passado, na Cidade 2000. Outro espaço será escolhido para ser trabalhado em 2019.

O projeto se vale do conceito de intervenção temporária, corrente entre os estudiosos das dinâmicas urbanas. Na prática, é um exercício de arquitetura efêmera, constituindo-se de ações desenvolvidas em espaços ordinários de uma urbe, propondo novas possibilidades de uso de determinado espaço. O ponto-chave é que essas construções são pensadas, preliminarmente, como de curta duração e elas promovem interferências mínimas na estrutura permanente do local e, em geral, têm baixo custo.

Tais predicados favorecem o uso de interferências temporárias como experimentos urbanísticos. Testa-se, desse modo, uma ideia concebida para um logradouro específico da cidade. A interação dos habitantes ou frequentadores com as mudanças propostas é avaliada. A partir do estudo desses dados, a administração pública pode adotar em caráter permanente seu plano original ou, se necessário, introduz correções.

A avaliação da população que visitou o entorno do Dragão do Mar não deixa dúvidas quanto à aceitação da proposta de mudança. Quase 100% das pessoas que responderam à pesquisa sustentaram que o pedestre deve ser privilegiado. É uma avaliação coletiva que vai ao encontro da premissa de que o espaço urbano deve estar compromissado com a qualidade de vida dos cidadãos; que as ruas e vias públicas são para pessoas e não, apenas, para veículos.

Os transtornos temporários, nesse tipo de intervenção, são inevitáveis. Se as alterações viárias, como as ciclofaixas, causavam celeumas, agora sua presença nas avenidas e ruas da cidade já não são motivo para polêmica. Aos poucos, a metrópole passa por alterações, ganha novas feições e, com iniciativas simples, caminha para solucionar impasses que pareciam sólidos como o concreto.