Silêncio eloquente

O barulho é um dos elementos indissociáveis da vida moderna. É visto, por alguns, como signo das agitações da sociedade contemporânea e da produtividade almejada. Na contramão desta percepção errônea, o silêncio tem sido cada vez mais valorizado. São bem documentados seus múltiplos benefícios ao bem estar, seja na garantia da saúde do corpo - no caso, preservando a audição -, e da mente.

Desde 1997, Fortaleza dispõe de uma regulamentação legal para a emissão de ruídos - a Lei do Silêncio. Seu objetivo é proporcionar a todo cidadão um espaço comum em que seja respeitada sua integridade física, a partir de um princípio ético básico: a ação de ninguém pode interferir na liberdade do próximo. A legislação permitiu que abusos, anteriormente correntes e livres de sanção, fossem combatidos. Caso do funcionamento de estabelecimentos demasiado ruidosos, operando em áreas residenciais ou sob prejuízo de quem neles trabalham, submetidos a um ambiente insalubre.

A Lei Municipal nº 8.097 serviu de base legal para o combate à cultura dos chamados "paredões". Equipamentos de som automotivos, montadas tendo por Norte o exagero de decibéis, os "paredões" nem sempre era a manifestação de um apreço à música. Usados em disputas entre seus proprietários, em que se media a potência, frequentemente importunavam. Ações de fiscalização coagiram a prática, por vezes resultando na apreensão deste tipo de equipamento.

No fim do ano passado, foi sancionada a Lei nº 10.644, que modificou a Lei do Silêncio. Atualizações foram feitas em atenção à necessidade de conciliar o interesse da coletividade e as necessidades de profissionais do ramo de entretenimento. O combate ao desrespeito ao próximo seguem ditando a tônica do texto aprovado pela Câmara Municipal e sancionado pelo Prefeito. Contudo, evitam-se práticas que costumavam ser motivos de celeumas, caso da apreensão de equipamentos de trabalho de músicos. Agora, estes só podem ser recolhidos a partir da segunda autuação do infrator.

Os primeiros resultados da mudança começam a se traduzir em dados, divulgados pela Agência de Fiscalização de Fortaleza (Ages). Número recente divulgado pela Ages dá conta que o órgão realizou 494 autuações por excesso de ruído, no primeiro semestre deste ano. O número é 20% menor do que o observado no mesmo período do ano passado.

Segundo a avaliação da agência, ainda que mudanças tenha sido operada na Lei, os números não se explicam apenas pela flexibilização em relação ao que antes era vetado. Os novos hábitos, fomentados por mais de 20 anos de legislação e de fiscalização, resultariam em conscientização e observância dos limites estabelecidos pela Lei do Silêncio.

Em Fortaleza, é permitido o nível máximo de som de 70 decibéis (dB), entre 6h e 22 horas, a "usados em residências, estabelecimentos comerciais e de diversões públicas". No período complementar, de 22h às 6 h, o nível máximo tolerado é de 60 dB. A métrica local é mais tolerante do que a recomendada pela Norma Brasileira (NBR) 10.151/2000, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Segundo ela, o ruído em áreas residenciais não pode ultrapassar 55 decibéis no período que vai de 7h às 20 horas; ou de 50 decibéis, entre 20h e 7h (aos domingo e feriado, o período noturno é estendido e chega às 9 horas.

Ajustes como estes, da legislação e dos hábitos, contribuem para uma cidade mais silenciosa e, por consequência, saudável e civilizada.