Prerrogativas de investigação

Sem adentrar o debate sobre restrição ou revogação da competência pela prerrogativa de função, atecnicamente chamada de foro privilegiado, o ordenamento jurídico garante aos ocupantes de determinados cargos ou funções o seu processamento e julgamento (não distinguindo sua investigação preliminar), nos crimes comuns, perante um tribunal, excluindo-os, assim, do alcance do juiz de primeiro grau.

Quanto a investigação pré-processual nesses casos, parte da doutrina e jurisprudência condiciona a abertura de inquérito policial a prévia autorização judicial. Esta se mostra despicienda, porém, pelo seguinte: inexiste expressamente no plano constitucional ou legal; o controle da legalidade dos atos de polícia judiciária - o que não se confunde com a atribuição de investigar - e o (in)deferimento das medidas sujeitas a reserva de jurisdição se mantêm sob competência do juiz natural: o tribunal perante o qual se dê a prerrogativa de função; a busca por elementos de prova requer urgência, a separação de tarefas na persecução é própria do sistema acusatório (mesmo mitigado) e eventual vício formal no inquérito não causaria nulidade à ação penal.

Ademais, o parâmetro para instauração dos procedimentos policiais está no artigo. 5º do Código de Processo Penal, aplicável, no que couber, aos inquéritos extrapoliciais (a cargo de outros órgãos), como no caso de infração penal atribuída a membro do Poder Judiciário ou do Ministério Público, ou praticada em sede ou dependências do Supremo Tribunal Federal, (STF), da Câmara dos Deputados ou Senado (Súmula 397 do STF), de acordo com os respectivos regimentos internos.

Os tribunais superiores já ratificam a prescindibilidade da autorização em tablado, a exemplo da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do recurso especial nº 1563962/RN em 08/11/16. Reconheceu-se no Supremo Tribunal Federal, em 28/02/18, a validade de inquérito policial contra prefeito sem prévia autorização do Tribunal de Justiça (recurso extraordinário nº 991016/GO).

Vincular o início do inquérito à prévia autorização judicial vai de encontro, portanto, aos princípios da isonomia, da legalidade, da celeridade processual e da vedação à proteção deficiente; às atribuições das Polícias Civis e Federal (art. 144, §§ 1º e 4º, da Constituição), à competência legislativa privativa da União em matéria processual penal (artigo. 22, I, da Constituição) e ao tipo de processo penal traçado pelo constituinte.

José Hugo de Alencar. Mestre em Direito Constitucional