Se Boechat vivesse...

Transparência, simplicidade, informalismo, improviso, bom humor, ironia fina e precisa, uma sintonia meio que química com o público, uma forma irreverente e divertida de fazer jornalismo que acaba entretendo o telespectador, o ouvinte de rádio ou o leitor de jornal. Eis aí o que Ricardo Eugênio Boechat conseguiu amalgamar com maestria em sua vida de comunicador, num três em um jornalístico mágico e sedutor, além de inédito num País em que a imprensa nem sempre logra cumprir fielmente seu magno papel de lanterna da democracia.

Boechat chutava com as duas (âncora de TV e rádio) e ainda tinha uma cabeceada (coluna em periódico) fatal. Era o "Pelé do Jornalismo". Porém, além de todo esse talento, o que de fato atraiu em torno de si notório respeito, até dos destinatários de suas críticas mais ácidas, foi a sua independência. E assim foi nessas três modalidades ao longo de sua intensa vida jornalística.

Difícil avaliar, pois, a abrupta saída do cenário nacional de um formador de opinião desse quilate, ainda mais em hora tão estratégica de retomada do crescimento econômico e de construção de uma democracia autêntica, mais transparente, que privilegie o mérito, a probidade e as liberdades civis e democráticas.

O legado, contudo, fica. A imprensa pátria haverá de viabilizar o surgimento de outros Boechats, no que tange à sensatez, coragem e credibilidade sustentável pela independência do jornalista para que nos tornemos enfim uma sociedade verdadeiramente livre, viciada em democracia, sedenta de justiça legal e social e amante da paz pública.

Paz pública... Se Boechat vivesse, o pacote anticrime de Moro estaria segurado. Com sua encantadora irreverência e coerência à la Barbosa Lima Sobrinho, o imortal da ABI, Boechat mandaria aos capi do crime organizado um recado mais ou menos assim: "O trema caiu só na ortografia; para os bandidos, não! Então, TREMA a bandidagem!". Independência é tudo.