O padeiro amoroso

Em 1967, eu era aluno do Colégio Cearense. Próximo ao colégio, morava Tia Nazaré, senhora alegre que sempre me recebia com imenso carinho. Ia visitar minha irmã Maggy, colega de Miriam, sobrinha de Nazaré. As duas moravam naquela casa simples e alegre. Às vezes, me encontrava com o João de Paula, estudante de Medicina. João um ser benfazejo. Riso fácil. Abraço generoso. Elegante. Palmilha de nobreza.

Em 1968 ingressei na Faculdade de Medicina, de novo o João. Líder nato. Cordato. Talvez sorvesse os momentos mais difíceis de sua vida. Centena de estudantes lutando para serem acolhidos na UFC. Numa noite nua e empobrecida de clareio, já meados de março, a aula inaugural anual. Quando o Gen. Dilermando se preparava para falar, irrompe no meio do povo qual um profeta, o João. Falava. Protestava. Mas de maneira educada. Não aceitava um general dando aula numa UFC, com tantos professores. Não agrediu, não insultou. Apenas, estarrecido, não aceitava aquele acocoramento de um reitor pusilânime e trêfego. 50 anos depois, vou a Crateús.

Num domingo de maio. Quando a Caatinga se veste de sua roupagem mais lírica. Explode o verde pelos caminhos tortuosos e solitários. Na Catedral do Senhor do Bonfim, de novo, João de Paulo e seus irmãos, numa festa de efusão de alegria, em pleno corpo da igreja, celebrando o centenário abençoado do seu pai: Norberto Ferreira Filho. O nosso querido Ferreirinha. E vi que um pai tão amado e tão festejado, tinha trazido ao mundo estas joias preciosas que são seus filhos. Os filhos são parte desta coroa de que fala o texto bíblico. Estes filhos que o cercavam eram o seu mais valioso presente. Ferreirinha é um homem radicalmente bom. É o Espírito Santo que faz revelar a bondade do seu Ferreirinha. Padeiro que servia o pão para todos. O alimento de todas as mesas. De todas as classes sociais. O alimento do rico e do pobre. Do rei e do plebeu. Brota nas terras ricas e nos sertões batidos pelo sol. Brota nos altiplanos e nas planícies. Mas, Ferreirinha servia o melhor pão. A sua ternura. O seu gesto de partilha. Nicodemo era um amigo secreto de Jesus. De dia trabalhava e a noite estava com Jesus. Nicodemo quer dizer Victor Populi (vencedor do povo). Era da primeira nobreza. Ferreirinha é o amigo precioso de Jesus. Um coração cheio de abraços e de amor. Pois este padeiro amoroso e sábio é centenário.

JOSÉ MARIA BONFIM DE MORAIS
Médico cardiologista