Judicialização e ativismo judicial

Antes de qualquer providência ao debate são imprescindíveis noções práticas, a cerca de matérias que competem semanticamente, disputam sentidos ou se insinuam em busca de compreensão. Nunca fui a favor do ativismo judicial, em sua visão mais política, porém, ao mesmo tempo, achava que o Judiciário jamais poderia quedar-se estático.

Ao ler "A Judicialização da Vida e o Papel do STF", de autoria do ministro Luís Roberto Barroso, levado à lume pela Editora Fórum, fui capaz de afastar esses extremos, essencialmente pela abordagem leve e clara, com distanciamento da retina positivista, através de ligaduras ao novo constitucionalismo, abrindo caminhos à modernidade brasileira.

Ainda que possa parecer uma forte intromissão em outras esferas de poder e decisão - e assim seja - em muitas matérias como tutelas e garantias de direitos individuais, penso que não havia como inadmiti-lo. Ou o Judiciário assumia postura intervencionista, ou permanecia marmorizado, conservador, incompreendido socialmente quanto a sua razão existencial de ser.

Para Luís Roberto Barroso, o ativismo judicial "está associado a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros poderes". Adverte: "em muitas situações, sequer há confronto, mas mera ocupação de espaços vazios".

Já a judicialização, embora tenha a mesma raiz da omissão, parece mais branda: "significa que questões relevantes do ponto de vista político, social ou moral, estão sendo decididas em caráter final pelo Poder Judiciário". Assim, o ativismo apresenta-se radical, na prática, atua muitas vezes como legislador, quando aquele poder sequer cuidou da matéria, enquanto a judicialização é uma circunstância do desenho institucional, quando determinadas questões foi, por fim, chancelada pela Justiça.

A obra, que é fundamental para a compreensão da vida do direito e da vida dos brasileiros, não olvidou em pontuar as causas deste protagonismo institucional do Judiciário. Indica três delas. A primeira se deve ao reconhecimento da importância de um Judiciário forte e independente, como elemento essencial para as democracias modernas. A segunda causa parte da crise de representatividade e de funcionalidade do Poder Legislativo. Já algum tempo, os cidadãos não acreditam nos parlamentares.

Acrescento: tudo mudou em nossa vida - a esfera pública, a globalização e o mundo digital - mas a política se exerce da mesma forma há pelos menos duzentos anos, sem uma única mudança em seus estilos. A terceira causa, finalmente, deve ser dirigida aos próprios políticos que, voluntariamente, postergam a resolução de matérias que lhes competem e, necessariamente, os titulares desses direitos passam a reivindicar em outros espaços, transferindo o ônus ao Judiciário, justamente para se eximirem de responsabilidades.

Durval Aires Filho

Desembargador