Gargalos no cárcere

A escalada da violência e das facções criminosas coincide com a deterioração do sistema prisional brasileiro. Nos últimos anos, as depauperadas unidades carcerárias se tornaram centros de comando para as quadrilhas, as quais tomam decisões estratégicas entre paredes que deveriam, na verdade, anular as forças da delinquência, mas, ao invés disso, fortalecem-nas. Elas usam as cadeias também para afiliar novos membros e ganhar território e força bruta na disputa por fatias maiores do narcotráfico.

As iniciativas para desmantelar o crime organizado, ainda em fase inicial devido à complexidade do problema e à lentidão da União em depositar a atenção necessária ao urgente assunto, acabam por esbarrar na estrutura deplorável das penitenciárias.

A maioria delas não possui condições de infraestrutura e pessoal para garantir, com retidão, o controle do Estado sobre os internos e, muito menos, a reabilitação social deles. Tanto é que os presídios têm sido cenários de consecutivos episódios de carnificina.

O acirramento da rivalidade de gangues concorrentes aumentou o número de homicídios nas dependências das prisões brasileiras. De 2013 até o início de março deste ano, foram registradas 180 mortes em unidades prisionais no Ceará, de acordo com levantamento da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). Em janeiro deste ano, dez internos morreram em uma chacina na Cadeia Pública de Itapajé, a maior matança já registrada em uma unidade prisional cearense.

É também evidente o crescimento da população carcerária. Entre 2008 e 2018, o contingente de presos nas unidades sob responsabilidade da Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus) passou de 12.481 para 28.506, salto de 128%. Na ausência de uma solução coordenada em escala federal, o problema recai sobre o colo de todos os estados.

Superlotados e degradados, os presídios são ambientes de enorme pressão. Uma vez que a Constituição cidadã de 1988 não prevê prisão perpétua e tampouco pena de morte, o sistema deveria, por óbvio, preparar esses indivíduos para a reintegração à sociedade. No entanto, a impressão é que, na reinserção, parte dos presos regressa ainda mais inclinado à vida do crime. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a reincidência criminal atinge 24,4% dos encarcerados.

Ao longo do cumprimento da pena, a maioria se depara com um ambiente hostil e brutal, com a desocupação de trabalho e estudo e com a presença cada vez mais marcante e intimidadora de quadrilhas organizadas. Estas buscam continuamente atrair novos integrantes, e a cadeia lhes parece um lugar prático para recrutar.

Além de alimentar as engrenagens do crime, os presídios, na forma como estão configurados, facilitam sobremaneira a sustentação das gangues do narcotráfico. É um despautério a negligência das autoridades competentes com a comunicação ilegal que ocorre dentro dos presídios, por meio de telefones celulares que adentram os domínios penitenciários com facilidade injustificável.

Se o sistema se mostra incapaz de conter o contrabando e impedir a entrada de aparelhos telefônicos, resta a opção do bloqueio de sinal, que voltou a ser discutida no Legislativo.

Sem uma reforma profunda no sistema prisional, as feridas da violência não irão sarar por completo e muitos dos esforços que começam a ser feitos podem ter efeitos limitados.