Editorial: Direitos de todos

A organização não-governamental internacional Human Rights Watch (“Observatório dos Direitos Humanos”, em tradução literal) divulgou documento por meio do qual informa que o Brasil enfrenta superlotação do sistema carcerário e uma epidemia de violência doméstica. A rigor, o que a ONG aponta não é novidade. O noticiário cotidiano, embora sem sistematizar dados e números, indica há anos, talvez décadas, esse quadro tão preocupante quanto aterrador.

A entidade, atuante em todo o mundo há mais de quatro décadas, relata que em junho de 2016 havia mais de 726 mil pessoas presas no Brasil, apesar de então o sistema carcerário ter capacidade para comportar metade desse contingente. Mesmo com as dificuldades e as necessidades daquela conjuntura, o que se viu foi um crescimento exponencial do problema. E, dois anos depois, o número de detidos já alcançava 842 mil.

Em diagnóstico sobre o País, a ONG é incisiva: “Violações crônicas de direitos humanos assolam o Brasil. Alguns policiais realizam execuções extrajudiciais, torturam detentos e abusam de crianças e adolescentes em conflito com a lei. Muitas prisões e cadeias brasileiras enfrentam problemas de grave superlotação, e a incapacidade das autoridades penitenciárias de manterem o controle sobre as prisões deixa os presos vulneráveis à violência, extorsão e recrutamento por facções criminosas”.
A Human Rights Watch conta com cerca de 400 componentes em diversos pontos no mundo, entre advogados, jornalistas e especialistas em direitos humanos e acadêmicos de origens e nacionalidades distintas. São, portanto, visões múltiplas sobre problemas comuns.

Há mais deformidades relacionadas pela organização: “Outros problemas em relação aos direitos humanos incluem a violência contra mulheres, as mortes de jornalistas e blogueiros por causa de seus trabalhos e a violência contra camponeses e lideranças indígenas envolvidos em conflitos de terra. Ainda, os responsáveis por abusos durante o regime militar, de 1964 a 1985, continuam a ser protegidos da Justiça em virtude de uma lei de anistia de 1979, aprovada durante o regime”.
É necessário observar que o relatório da Human Rights Watch ganha dimensão em meio aos ataques verificados no Ceará e atribuídos a facções criminosas, a partir de ordens emitidas de dentro de presídios por sentenciados por crimes vários. E, ainda, se dá num paralelo histórico com a assinatura de decreto presidencial que simplifica a posse de armas pelos cidadãos brasileiros.

Têm-se, assim, três elementos que não podem ser excluídos de análises. O primeiro é a crise da segurança – o que se registra no Ceará poderia ter ocorrido em qualquer Estado, afetando gravemente a população, e isso já indica a complexidade da situação e a fragilidade a que se submete a sociedade. O segundo é a reação oficial, ou uma pseudorreação, que aparenta relacionar o conceito de segurança ao uso de armas pelo cidadão, desvinculando-o de políticas de Governo e de Estado.
O terceiro é a exposição externa das fragilidades que o País enfrenta, o que se configura num complicador extremo para o crédito da nação junto a investidores e para os desafios de crescimentos social e econômico que se põem atualmente.


Assuntos Relacionados