Desvalorização do real

A disparada do dólar ante o real atingiu o maior patamar em mais de dois anos, ao ultrapassar a barreira de R$ 3,90, aproximando-se da cotação em 2016, no ápice da crise política, quando a ex-presidente Dilma Rousseff enfrentou processo de impeachment no Congresso Nacional.

A desvalorização da moeda brasileira relança sobre a economia velhos temores quanto aos possíveis riscos da depreciação da taxa de câmbio, cujos efeitos podem ser o enfraquecimento no volume dos investimentos de empresas que desempenham papel relevante na produção nacional e a redução do poder de compra do consumidor.

A repercussão mais imediata da alta do dólar recai sobre o custo de capital das empresas que, regularmente, são obrigadas a importar produtos e equipamentos para a manutenção de suas atividades. Os itens comercializados por elas logo refletem a sobrecarga provocada pela elevação desse gasto extra, pois mesmo quando o artefato vendido à população é fabricado no Brasil, habitualmente existem despesas com as matérias-primas e insumos comprados no exterior, que repercutem no preço cobrado ao consumidor final. O pão francês exemplifica tal cadeia. O alimento, amplamente demandado pelos brasileiros, depende do trigo importado, em especial, da Argentina para sua produção.

A elevação do custo de capital das empresas também compromete a capacidade dos investimentos delas na ampliação de suas infraestruturas, na modernização do maquinário utilizado e na abertura de mais postos de trabalho.

Um dos poucos setores beneficiados pela depreciação do real são os exportadores de bens industriais, que ganham em competitividade no mercado internacional por vender seus produtos a preços mais baratos. Tal ganho, todavia, é limitado e, além de as consequências sobre o Produto Interno Bruto serem modestas, pouco valem para corporações que almejam conquistar crescimento efetivo na participação do comércio exterior.

O fenômeno da alta do dólar tem sido sentido em quase todos os países emergentes em face da expectativa de aumento da taxa básica de juros nos Estados Unidos e dos posicionamentos do presidente Donald Trump no âmbito da política internacional. Com a economia norte-americana em trajetória ascendente e o baixo índice de desemprego, investidores passaram a avaliar que o bom momento deve resultar em pressão maior sobre os preços e estimular o Federal Reserve (Fed), Banco Central dos EUA, a elevar novamente os juros, nas próximas semanas, a fim de conter a inflação.

Os fatores externos, contudo, não são a única justificativa para essa imprevista escalada do dólar. No Brasil, existe uma gama de fatores internos culpados por potencializar tal disparada e, dentre eles, muitos não podem ser superados apenas com as medidas protetivas do Banco Central, que tem lançado mão de vários mecanismos de intervenção para tentar desacelerar tal movimento.

Crise fiscal, grande número de desempregados, reformas estruturais emperradas e incertezas quanto à disposição para interromper o longo ciclo de instabilidade econômica também são responsáveis por fragilizar o real. Se não há, naturalmente, meios de impedir eventuais alterações no humor da economia dos Estados Unidos, que repercutem globalmente, é notória a lista de deficiências domésticas com ajustes em compasso de espera. À medida que tais distorções permanecerem sem solução, a moeda brasileira persistirá perigosamente suscetível a oscilações no mercado cambial.