As regras do jogo

É de notório saber popular: a Lei da Ficha Limpa, em 2010, endureceu as regras para aqueles que pretendem disputar cargos públicos eletivos. Foram dezenas de alterações concernentes ao processo eleitoral, mas a mais célebre de todas elas foi a que determina a inelegibilidade de condenados criminalmente por órgãos judiciais colegiados ou ações transitadas em julgado.

Traduzindo do juridiquês, órgão colegiado é aquele cuja decisão é tomada por mais de um único juiz, como os Tribunais de Justiça ou os Tribunais Regionais Federais. Transitada em julgado é a denominação que se dá à ação que transcorreu por todo o rito do devido processo legal e foi encerrada, não cabendo mais recurso. Diferentemente do que muitos acreditam, portanto, é completamente irrelevante a condição de encarceramento do condenado.

Em outras palavras, é possível haver tanto um presidiário elegível quanto um inelegível em liberdade. Um candidato preso, é claro, enfrentaria dificuldades em sua campanha, já que não poderia deixar o cárcere para participar de seus eventos. Mas não há, no direito brasileiro, qualquer relação entre aprisionamento e candidatura eleitoral. A discussão que corre, e cuja solução deverá ditar os rumos das eleições neste ano, é outra: a inelegibilidade do candidato é automática desde a sua condenação, ou se consuma somente com uma declaração da Justiça Eleitoral? Mais do que uma simples confusão jurídica, a questão repercute diretamente sobre a possibilidade ou não de um ficha suja proceder ao registro de sua candidatura.

Se lhe for permitido o registro, o ficha suja terá direito a todo o trâmite legal, tipicamente vagaroso, da Justiça brasileira. Impugnações, recursos e prazos dilatados tornam praticamente impossível o trânsito em julgado desse pedido antes do 1º e 2º turnos das eleições (1º e 31 de outubro de 2018, respectivamente).

Até essa decisão final, o candidato já teria disputado o pleito e, possivelmente, saído vencedor. Uma vez que a Lei da Ficha Limpa nada esclarece sobre o tema, a resposta ficará sujeita à interpretação pessoal dos magistrados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ainda do Supremo Tribunal Federal (STF).

O ministro Luiz Fux, atual presidente do TSE, tem dado declarações à imprensa de que é favorável à aplicação automática da inelegibilidade, desautorizando assim o registro de candidatura do ficha suja. Antes que haja uma deliberação formal da Justiça, contudo, são palavras ao vento. Pressões políticas podem surtir mais efeito do que argumentos jurídicos em decisões dessa magnitude.

ISAAC ANDRADE
Advogado