Ameaça ao crescimento

A corrosão da renda familiar, desde a instalação da crise econômica, obrigou várias crianças e adolescentes a se submeterem a condições insalubres de trabalho. Muitas são expostas compulsoriamente à situação ilícita a fim de que elas contribuam financeiramente com o orçamento gerido pelos pais ou responsáveis legais.

A Constituição, porém, determina que o jovem pode exercer atividade laboratícia a partir dos 14 anos, como aprendiz vinculado a um projeto de formação escolar, ou somente após completar 16 anos de idade. Ao serem ignorados tais requisitos, ameaça-se a infância e se implantam sequelas na vida adulta que são refletidas no âmbito profissional e psicológico das vítimas.

Quando a criança se insere precocemente no mercado de trabalho, na maioria das vezes, ela abandona a vida escolar e deixa de ter acesso a diversos benefícios garantidos pela educação.

Entre os prejuízos, perde todo o aprendizado que pode ser assimilado diante da convivência com outras pessoas da mesma faixa etária, proporcionada pelas unidades de ensino. Esse processo é essencial ao desenvolvimento saudável.

Outro dano é a irreversível redução das chances de esses jovens, no futuro, obterem emprego formal, que oferece bons salários, pois fora da escola, existem obviamente consideráveis efeitos deletérios sobre o nível de qualificação.

De acordo com as pesquisas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2016, havia 1,8 milhão de jovens de 5 aos 17 anos empregados. Desse total, 998 mil estavam em situação ilegal de trabalho. O cenário mais grave é na região Norte, onde a proporção de crianças entre 5 e 13 anos de idade ocupadas equivale a 1,5% de todo esse grupo etário. O Nordeste vem atrás, com 1%. O Sudeste fica em torno de 0,3%.

Um dos maiores obstáculos no combate à exploração do trabalho infantil é a aceitação desse fato como normal. Os órgãos públicos realizam campanhas para conscientizar a população sobre o que representa o problema. Todavia, perduram as dificuldades em fazer uma parte da sociedade compreender os grandes malefícios em submeter prematuramente a juventude a jornadas extenuantes.

A agricultura, por exemplo, é responsável por concentrar o maior contingente de jovens no trabalho do campo, principalmente, devido a uma cultura de que é importante colocar a criança em atividades laborais para permitir que elas consigam rapidamente incorporar as técnicas utilizadas pelos seus pais. Entre os pequenos até 13 anos, segundo o IBGE, que trabalhavam em 2016, 47,6% estavam ocupados na zona rural.

Em razão da aceitação dessa conduta, o volume de denúncias não traduz a magnitude do problema. Embora seja possível comunicar às autoridades competentes situações ilícitas por meio de ferramentas disponíveis na Internet ou através do telefone (Disque 100), a mobilização social é reduzida. Eliminar essa apatia se tornou desafio premente, sobretudo, em face de o trabalho infantil estar, habitualmente, associado a outros atos de exploração, como cárcere privado, abusos físicos e violação sexual.

O governo brasileiro se comprometeu a erradicar até 2015 a presença de crianças e adolescentes nas formas de trabalho vedadas, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho, mas nem se aproximou da meta. Para cumpri-la, ainda que tardiamente, é decisivo adotar ações públicas que incentivem os pais a colocar seus filhos na escola e fiscalizem os setores mais recorrentes nas práticas exploratórias desse trabalho ilegal.