Alvos da PF usam Refis para parcelar R$ 4 bilhões em autuações por corrupção

Nos processos, a Receita quer receber o IR (Imposto de Renda) sobre valores pagos e recebidos que, segundo a PF, foram feitos ilegalmente

Escrito por Folhapress ,

Empreiteiras, agências de publicidade, empresas do setor elétrico e outras companhias investigadas pela Polícia Federal parcelaram pelo Refis, programa de refinanciamento de débitos tributários, cerca de R$ 4 bilhões em autuações da Receita Federal por fraudes e corrupção.

Na estimativa de auditores, o valor representa 20% das mais de 3.000 autuações desde que a Operação Lava Jato estourou, em março de 2014, até o início deste ano. O fisco cobra R$ 20 bilhões.

Nos processos, a Receita quer receber o IR (Imposto de Renda) sobre valores pagos e recebidos que, segundo a PF, foram feitos ilegalmente –mesmo que o dinheiro tenha sido devolvido depois por meio de acordos de colaboração ou leniência.

Aumento de patrimônio, lucros realizados e omissão de receitas, por exemplo, foram usados pelos auditores para autuar empresas, políticos e empresários envolvidos nos esquemas de corrupção na Petrobras e em outras empresas estatais.

Essas autuações vinham sendo discutidas na própria Receita e, nessa fase, estavam protegidas por sigilo.

No entanto, o Código Tributário Nacional e uma legislação específica sobre créditos parcelados exigem que a Receita dê publicidade aos débitos ali parcelados.

Para obter uma radiografia completa dos R$ 4 bilhões parcelados para as empresas, a Folha pediu a lista completa das prestações na Receita via Lei de Acesso à Informação e ainda aguarda a resposta. À reportagem a Receita informou que só fará a consolidação em setembro.

Integrantes do governo e advogados que participaram das negociações do Refis com o fisco afirmam que pelo menos três empreiteiras parcelaram suas autuações.

Lava Jato

Flagradas pela Operação Lava Jato no esquema de corrupção em contratos da Petrobras, Galvão Engenharia, OAS e Constran parcelaram R$ 160 milhões, R$ 20 milhões e R$ 10 milhões em autuações, respectivamente, segundo apurou a reportagem.

Esses valores foram adicionados às demais pendências tributárias também parceladas pelas companhias.

As três empreiteiras estão em recuperação judicial.

A Galvão foi uma das primeiras a ter seus executivos condenados por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e associação criminosa em contratos com a Petrobras.

Segundo a Justiça, os ganhos ilícitos foram obtidos pelo menos entre 2008 e 2011.

Pivô do caso que levou o ex-presidente Lula à prisão –o caso do tríplex em Guarujá (SP)–, a OAS teve executivos condenados por corrupção em contratos e aditivos com a Refinaria Getúlio Vargas (Repar), no Paraná, e a Refinaria Abreu e Lima (Renest), em Pernambuco.

Ambos os empreendimentos pertencem à Petrobras.

Controlada pela UTC, a Constran não só fez parte do "clube das empreiteiras", como ficou conhecido o cartel das construtoras na Petrobras, como, segundo investigadores, fraudou a licitação e superfaturou trechos da ferrovia Norte-Sul.

Nessa obra, o TCU (Tribunal de Contas da União) condenou a empresa a devolver R$ 70 milhões por danos aos cofres públicos.

De acordo com a legislação tributária, essa cobrança não exime a Receita de cobrar impostos devidos.

A Marfrig, uma das maiores processadoras de proteína animal do mundo, foi investigada em duas operações da PF, Sépsis e Cui Bono?.

O fundador da empresa, Marcos Molina, afirmou em depoimento aos delegados ter pago R$ 617 mil ao operador Lúcio Funaro para a liberação de empréstimos na Caixa Econômica Federal, quando o então deputado Geddel Vieira Lima era vice-presidente do banco.

A empresa foi autuada pelo fisco em R$ 1,5 milhão.

A lei que criou o Refis proibiu somente que pagamentos resultantes de acordos de leniência fossem inscritos. Não há impedimento para débitos referentes a autuações da Receita.

A reportagem consultou as quatro empresas. OAS e Marfrig informaram que não se manifestariam.

Galvão Engenharia e Constran não responderam aos questionamentos.

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