Ações no Ceará incitam debates sobre alteração na Lei Antiterror

Os ataques criminosos no Estado reacendem o debate nacional sobre a proposta de alteração da Lei 13.260/16, criada para as Olimpíadas. Na área jurídica há questionamentos sobre a efetividade do endurecimento da norma

Escrito por Redação , metro@verdesmares.com.br

Uma lei nacional aprovada no contexto brasileiro dos Jogos Olímpicos de 2016 a fim de atender a demandas internacionais de criação de normas específicas de combate ao terrorismo volta a ganhar ênfase no cenário de sucessivos ataques criminosos contra transporte, pontes e bens públicos e privados no Ceará. As ocorrências no Estado acenderam o debate sobre as propostas de alteração da Lei Antiterrorismo 13.260/2016. No entanto, no campo jurídico a proposta de endurecimento da legislação provoca divergências e a efetividade desse tipo de modificação para, por exemplo, refrear a criminalidade e inibir ataques criminosos é questionada. 

Hoje, conforme advogados ouvidos pelo Sistema Verdes Mares, quem incendeia prédios, viadutos, ônibus ou bens particulares não pode ser enquadrado na Lei Antiterrorismo, que em determinados casos, prever a aplicação de 30 anos de reclusão para que realiza atos caracterizados pela norma como terrorista. De modo geral, esclarecem os advogados, os acusados são enquadrados na Lei de Organização Criminosa (12.850), ou em artigos do Código Penal como o 121 de homicídio simples, cujo a pena varia de 6 a 20 anos, e no 251 crime de explosão, cujo a pena é de 3 a 6 meses de reclusão. 

A proposta de alteração da lei tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado e busca, de modo geral, alterar quatro pontos: definir como terrorismo as condutas como “incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado”, punir quem auxilia ato de terrorismo ou quem recompense ou louve outra pessoa, grupo, organização ou associação pela prática dos crimes de terrorismo e estabelecer que quem for condenado pela prática de terrorismo deverá cumprir pena em prisão de segurança máxima.</CW> 

Diante das sucessivas ações criminosas dissipadas no Estado, o governador Camilo Santana manifestou-se sobre autonomia de poder criar leis que pudessem enquadrar como condutas terroristas atos semelhantes aos praticados no Ceará nos últimos dias. No entanto, esta é uma competência restrita a União. 

Efeitos

Para o advogado criminalista e professor de Direito Penal da Universidade Federal do Ceará (UFC), Daniel Maia, o atual texto da lei apresenta problemas pois, por exemplo, ações criminosas praticadas no Estado não podem ser caracterizadas como terrorismo devido a motivação. A lei estabelece que, para ser terrorismo, atos criminosos como transporte de explosivos e gases tóxicos e a sabotagem de transporte, aeroportos, estações, dentre outros, para provocar terror social ou generalizado devem ser motivados por xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião. “A facção não age motivado por isso”, ressalta o professor. Portanto, não é possível aplicar a lei, na forma como está, a situações como as vivenciadas no Ceará. O advogado concorda com a alteração, mas diz que isso deve ser feito com a retirada da parte da lei que especifica a finalidade dos atos criminosos, de modo que toda ação prevista na lei realizada independentemente do propósito será enquadrada como terrorismo.

Já o promotor de Justiça da Comarca de Juazeiro do Norte, Aureliano Rebouças Júnior, reforça que enquanto não fosse regulamentada qual conduta é caracterizada como terrorismo, não teria como agir legalmente para coibir esse tipo de crime. Por isso, defende ele, a existência da lei se justifica. Mas, explica, as normas jurídicas não podem ser vagas e é necessário aprimorar o texto em questão. 

O endurecimento da lei é visto por ele como uma possibilidade de retração das ações criminosas. Outra modificação ressaltada pelo promotor é que a Lei de Organização Criminosa requer que a ação executada tenha tido a participação de quatro indivíduos ou mais. Já a Lei Antiterrorismo prevê que a ação pode ser individual ou coletiva. 

Solução

O advogado criminalista, professor da Universidade de Fortaleza (Unifor) e da UFC, Nestor Santiago, questiona a efetividade da mudanças para a concretização de efeitos, pois, segundo ele, “toda mudança legislativa cria uma esperança de que tudo vai se resolver”. Mas isto, na prática, pondera ele, não se sustenta. “Um exemplo disso é a tipificação de crime hediondo que se tinha o apelo e não reduziu a violência”, ressalta. 

“A solução nunca vem só pela criação de uma lei. Nós temos que ter outros meios mais inteligentes para tentar combater a criminalidade”. Porque só a lei não vai fazer com que os criminosos parem de cometer crimes”, argumenta o advogado. Ele avalia que a possível redução da criminalidade no Ceará pode ocorrer a partir da intensificação de ações integradas e fortes de diversas instituições do Poder Judiciário, o Ministério Público, a Polícia Civil e a Federal.


 

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