Mudanças na Av. Santos Dumont terão que esperar novos projetos

Escrito por Redação ,
A via, assim como outras, não suporta mais o fluxo diário de veículos e carece de intervenções urgentes

Há 72 anos, nascia a principal via urbana municipal de Fortaleza. A Avenida Santos Dumont, com oito quilômetros de extensão, liga seis bairros: Centro, Aldeota, Papicu, Varjota, De Lourdes e Praia do Futuro, beneficia diretamente 150 mil moradores, de forma direta, e foi criada para ser um marco da modernidade no trânsito da Capital. Passadas sete décadas, a via não aguenta mais o fluxo de 51,5 mil veículos por dia, registrando congestionamentos gigantescos de domingo a domingo e tirando a paciência de muitos pedestres e condutores.

O local, com grande volume de carros, tem congestionamentos diariamente FOTO: RODRIGO CARVALHO

Desde 2008, são previstas mudanças, como sentido único em toda a sua extensão para tentar melhorar o sufoco diário. No entanto, admite o presidente da Autarquia Municipal de Trânsito (AMC), Ademar Gondim, as medidas deverão ser deixadas para a próxima administração.

Os planos para a via foram muitos e, agora, o mais recente, a ideia do binário com a Dom Luiz, entrava na Praça Portugal. Uma das alternativas em estudo será a de permitir que somente ônibus, vans e táxis trafeguem no trecho da praça. Os veículos particulares vindos no sentido Praia/Sertão, terão que fazer um desvio um quarteirão antes, ou seja, pela Barbosa de Freitas, passando pela Marcos Macedo e voltado à Dom Luiz pela Visconde de Mauá. Uma reunião marcada para essa semana entre comerciantes do trecho e AMC deverá tentar contornar insatisfações para se chegar ao consenso.

Problemas

Especialistas avaliam que não será essa mudança que reduzirá os problemas da avenida. Para o professor José Borzacchiello, não se pode pensar somente na Santos Dumont ou Dom Luiz e, sim, na mobilidade urbana de forma integral avaliando os pesos dos fluxos gerados nos bairros, nas cidades da região metropolitana, no Estado e na região.

As grandes rodovias que penetram na cidade diluem seus fluxos na vias existentes, conforme a localização dos equipamentos e dos serviços. "É urgente que, independente dos matizes partidários, as autoridades se juntem para discutir a mobilidade urbana, colocando a cidade como protagonista", afirma ele.

Antes de mais nada, aponta, a questão do trânsito na cidade extrapola os limites municipais. É necessária uma conjunção metropolitana para discutir sistema viário, acesso aos terminais, pontos de transbordo, integração tarifária, entre outros aspectos. "Fortaleza, em função de sua importância e centralidade, exerce enorme peso polarizador. São carretas, caminhões, vans, automóveis, motos, táxis, trens que acessam a cidade em seu cotidiano. As gestões das vias estão vinculadas em diferentes esferas administrativas", diz o professor.

Sistema

O arquiteto, urbanista e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), Euler Sobreira Muniz, avalia que a ideia do sistema binário para a Santos Dumont não é viável, mas concorda com Borzacchiello, quando este defende mais investimentos no transporte público, com a intermodalidade com oferta não só para ônibus, metrô, carros ou vans, mas para a bicicleta e o pedestre que queira andar a pé. "Tem que se pensar em calçadas adequadas, arborização, acessibilidade e segurança, este último, importantíssimo".

O titular do Núcleo de Atuação Especial de Controle, Fiscalização e Acompanhamento de Políticas do Trânsito (Naetran), do Ministério Público, Antônio Gilvan Melo, defende o rodízio como forma de reduzir congestionamentos. "Mas isso tem que contar com a conscientização de motoristas para o cumprimento dos dias das placas de cada".

Para ele, o rodízio não é uma boa ideia em razão da isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o que motiva o aumento da venda de carros. "A pessoa que só pensa em si e não na cidade vai adquirir outro veículo com final de placa diferente e continuar trafegando", diz.

Frota de veículos no Estado chega à casa de 2 milhões

Na avaliação da arquiteta e urbanista Mariana Reynaldo, é importante entender, em primeiro lugar, que o problema, não só de Fortaleza, teve origem na década de 50, quando o Brasil optou pelo modelo de transporte baseado no veículo particular, em detrimento do transporte coletivo.

A especialista afirma que os governantes pensavam, e muitos ainda pensam, que a única forma de continuar atendendo a necessidade de transporte da população é através do investimento no sistema viário voltado para o veículo particular.

Prevalece, aponta, a noção de que a cidade não tem limites para a sua expansão, podendo se expandir continuamente. E, como resultado disto tudo, a população continua a ter aumento nos tempos de viagem, perda da mobilidade das pessoas, principalmente das mais carentes, congestionamento e crescimento da poluição atmosférica e sonora.

Segundo dados do Departamento Estadual de Trânsito (Detran/CE), a frota de veículos em junho desse ano no Estado ultrapassou dois milhões. Fortaleza contabiliza 807,3 mil, sendo que, somente carros particulares, somam 462,2 mil.

A cidade não conta nem mesmo com um Plano Diretor efetivo, diz o engenheiro de Transportes, Paulo de Lima. "O projeto, que prevê o desenvolvimento do sistema viário básico do Município, foi aprovado em 2009, mas não saiu do papel", frisa.

O coordenador Nacional do Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para todos (MDT), Nazareno Stanislau Affonso, ressalta que se há um tema mais popular que o futebol no Brasil é o da mobilidade urbana. A maioria das pessoas nas conversas de bar, nos escritórios, em casa tem uma opinião a respeito de como melhorar o trânsito, os transportes coletivos, as calçadas, as bicicletas etc. Hoje, cidades médias e mesmo as pequenas já conhecem engarrafamentos diários.

Exigências

As exigências da Fifa para Copa 2014 devessem esquecer obras viárias para automóveis, concentrando-se exclusivamente em transportes público, calçadas acessíveis e sistemas para circulação das bicicletas, indicam uma reação a esse modelo que dar preferência ao carro do que a pessoa. "No entanto, a sociedade precisa estar atenta e mobilizada, pois recursos alocados não significam sistemas de transportes operando. Temos visto exemplos na história, obras inacabadas em várias partes do país".

OPINIÃO DO ESPECIALISTA

Cidade teve planos viáveis

Há muito que não se pensa uma cidade para todos e não somente para carros. Em 1975, o Plano Diretor Físico foi elaborado pela Coordenadoria de Desenvolvimento Urbano de Fortaleza, além de um levantamento aerofotogramétrico de 1972, no governo de Vicente Fialho.

O plano criava quatro zonas residenciais diferenciadas; zonas de adensamento comercial e residencial; zonas industriais; zona especial de praia; zonas especiais de preservação paisagística e turística; áreas de uso institucional; áreas de renovação urbana; e um plano viário hierarquizado classificando as vias como expressas, arteriais, coletoras e locais. Já no final do século XX, em 1992, no governo de Juraci Magalhães, foi lançado o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Fortaleza. Seu planejamento gerou metas para 20 anos com a remodelação do trânsito e novas vias, ordenamento urbano e áreas para lazer. Durante a atual gestão, ocorreu uma revisão do Plano Diretor, a qual contemplava a participação da sociedade e da Câmara de Vereadores. E ficou nisso. Sem ir adiante.

Se você faz duas novas vias como a Santos Dumont e a Osório de Paiva, mas deixa a pavimentação em estado lamentável, permite estacionamento e não lhe dá caráter de preferencial, é mesmo que nada fazer. Aqui em Fortaleza nunca nos preocupamos em voltar, queremos somente ir. E o pior, não temos transporte coletivo que preste. Além de ser péssimo ainda tem a poluição sonora terrível que faz com que se prefira andar a pé, já que não temos condição social para comprarmos helicópteros, que seria a única solução.

Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez)
Jornalista e historiador

SAIBA MAIS

Primeira planta da capital

É datada do ano de 1726 e atribuída ao capitão-mor Manuel Francês. No desenho é notável a forca, o pelourinho, o forte e a igreja. O português Antônio José da Silva Paulet fez primeiro desenho do que seria a atual configuração das ruas do Centro em 1818. Foi ele também o arquiteto da reforma da Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, iniciada em 1812 e concluída em 1821.

Em 1859

O arquiteto pernambucano Adolfo Herbster fez a primeira planta detalhada e precisa de Fortaleza. Na planta de 1875, ele esboça a continuação de ruas e avenidas para a expansão da cidade. Os bulevares que circundam o Centro formam a principal característica desta planta: atuais avenidas Duque de Caxias, Dom Manuel e Imperador. Herbster consolidou o plano de Paulet de organizar o traçado das ruas em xadrez, que continua sendo a principal característica das expansões que se seguiram.

LÊDA GONÇALVES
REPÓRTER
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