Comprimido para dançar

Escrito por Redação ,
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A geração do século 21, considerada no limite em todos os sentidos — falta de perspectiva profissional, afetiva, encontra-se mergulhada numa sociedade competitiva, violenta, entre o mundo real e o virtual, caracterizada pela pressa e pela busca do prazer rápido, eletrizante — elege as drogas sintéticas, feitas em laboratórios, como um elemento a mais para completar a sua noite. São as chamadas drogas das baladas. Alguns recorrem a medicamentos — um comprimido para emagrecer ou para dormir pegos da cabeceira da cama dos pais — misturados a bebidas alcóolicas. O ecstasy é o mais novo ingrediente das raves e festas technos mundo afora, por que o efeito é de até seis horas. Aos poucos, de forma tímida, está chegando ao Ceará. Conhecida como a droga das pistas, o ecstasy é ingerido sob forma de comprimidos, chamados de balas. São coloridos e trazem inscrição de desenhos lúdicos. Especialistas atentam para a medicalização da sociedade, que não suporta sentir dor, seja física ou psicológica, acaba sendo uma porta de entrada para esses jovens no mundo das drogas.

Jovens acharam na mistura de medicamentos e álcool uma saída para o prazer imediato e fuga da vida

A procura pelo prazer sem fronteiras e pelo desejo de se transgredir é o principal combustível de jovens acima de qualquer suspeita que recorrem a remédios para ter o melhor ´barato´.

Medicamentos com o princípio ativo de clonazepam, anfepramona, dimenidrinato, flunitrazepam, triexifenidila, benzidamina, entre inúmeros outros, misturados com álcool ou até refrigerante são os eleitos pelos jovens que buscam prazer a todo custo.

Os usuários, no entanto, até pela facilidade de acesso e também pelo consumo silencioso, não entendem isso como se drogar, mas como um momento de diversão plena. Vem daí os motivos dos alertas de especialistas e organismos de saúde de que é preciso rever o acesso a medicamentos controlados, de tarja preta, e até aqueles que são vendidos sem receita, como os antinflamatórios.

Hoje, apesar de haver um controle rígido do poder público, surpreendem as formas encontradas pelos usuários e dependentes desses medicamentos e outras drogas para ter o acesso às cápsulas e comprimidos que dão “barato”. No meio ilícito, entre bocas de fumo e outros pontos de vendas de drogas, os medicamentos que só podem ser comprados com receita específicas branca ou azul concedidas por médicos, são encontrados facilmente junto a outras drogas como maconha, cocaína, crack, LSD, ecstasy.

“Da mesma forma que existem bocas de fumo, que vendem desde maconha, crack, cocaína, tem também as dos remédios, conhecidos como ´rocha´, ´aranha´ ou ´ripnol´ e o que mais tiver efeito entorpecedor. Encontrar esses remédios é muito fácil”. O depoimento é do dependente químico em tratamento, João Lucas (nome fictício), de 36 anos, que, apesar de declarar que os comprimidos não eram a “sua praia”, assume que tomava para moderar o efeito do álcool que lhe deixava “cego e fora de si”.

“Com R$ 20,00, qualquer pessoa pode comprar uma cartela de clonazepam, medicamento conhecido entre os usuários como ´rocha´, que é vendido na beira do canal do Lagamar”, denuncia a coordenadora do Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD) Casa da Liberdade, Sheilla Arraes. Segundo ela, o controle é muito difícil, uma vez que alguns desses medicamentos controlados são vendidos pelos próprios pacientes. “Já aconteceu da gente descobrir paciente vendendo uma cartela de diazepam na porta do centro por R$ 5,00 para comprar crack”, relata.

E não é só isso. Acontece também de simulações, relatos elaborados e até teatros para fazer com que o profissional se sensibilize e prescreva o medicamento psicotrópico. Mas, conforme especialistas, o que pesa realmente é o tempo da consulta, que é insuficiente para avaliar a real necessidade daquele medicamento para o paciente.

“Existem estudos que mostram que o tempo médio de consulta na rede pública é de três a cinco minutos. Você acha que entre três e cinco minutos o médico avalia a sua real necessidade de qualquer coisa? Não avalia”, questiona a coordenadora do Centro de Informações sobre Medicamentos (CIM), da UFC, Mirian Parente Monteiro. Segundo a farmacêutica, uma prescrição inadequada pode sair a partir do momento em que o paciente não foi visto adequadamente.

PAOLA VASCONCELOS
Repórter

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