Ciclistas e pedestres continuam sob ameaça do desrespeito

Para mitigar os problemas, a Prefeitura de Fortaleza afirma que promove ações permanentes no setor

Escrito por Márcio Dornelles - Repórter ,

Três acidentes em Fortaleza, em bairros distintos e distantes entre si, chamaram a atenção para a permanente vulnerabilidade de ciclistas e pedestres. Montese, Praia do Futuro e Joaquim Távora são interligados por recentes episódios de violência no trânsito, contabilizando uma pessoa ferida e duas mortas na capital cearense. Ironicamente, os casos aconteceram no início do mês chamado Maio Amarelo, cujo enfoque é promover ações e debates sobre a redução de vítimas em ruas, avenidas e rodovias da cidade.

Um homem de 48 anos, possivelmente alcoolizado, por relato de moradores, foi atropelado ao cair na Avenida Gomes de Matos e morreu. O jovem Joe, 23, trafegava de bicicleta pela Avenida Dioguinho, na Praia do Futuro, quando foi arremessado para longe e teve morte imediata. Luana, 35, usava a ciclofaixa da Avenida Antônio Sales, que foi ignorada. Teve uma grave fratura na perna direita, que precisou ser parcialmente amputada.

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Nos três casos ocorridos no intervalo de uma semana, veículos maiores estavam envolvidos nos acidentes, por ordem: uma moto, um carro e um ônibus. É uma inversão do que exige o Código de Trânsito Brasileiro. "Em ordem decrescente, os veículos de maior porte serão sempre responsáveis pela segurança dos menores, os motorizados pelos não motorizados e, juntos, pela incolumidade dos pedestres", diz um trecho do artigo 29 da legislação de trânsito.

O Instituto Doutor José Frota, referência em traumas de alta complexidade, principal destino de acidentados no trânsito, atendeu 15.023 pessoas em 2017, quase 6 mil a menos que em 2014. Isolados apenas pedestres e ciclistas, o número caiu de 3.998 em 2014, para 2.837 no ano passado. Os casos graves também encontram alento nos dados do Observatório de Segurança Viária de Fortaleza (OSV), órgão vinculado à Universidade de Fortaleza. Apontam, em 2017, uma redução sistemática na violência no trânsito.

Em 2002, pedestres, ciclistas, motociclistas e ocupantes de veículos de quatro rodas representavam 381 mortes na capital cearense, o índice mais alto desde o acompanhamento pelo núcleo.

Os anos seguintes mantiveram-se na mesma média, até uma queda pontual em 2009, com 312 vítimas. Os números tornaram a crescer, passando por altas em 2011 (381) e 2014 (377). A sequência foi de queda: em 2015, 316 óbitos; 2016, 281; e 2017, 256 vítimas. No ano passado, foram 130 mortes envolvendo motociclistas, 94 pedestres e 19 ciclistas. Veículos comuns, de quatro rodas, representaram apenas 5%: 13 casos.

Despertar

Para o coordenador do OSV, Ezequiel Dantas, apesar da curva descendente de episódios, a estatística ainda é alta e deve continuar recebendo a atenção necessária com foco na tolerância zero para as mortes. "Fortaleza ainda tem números graves. O indicador, que já foi de 17 mortes para cada 100 mil habitantes, hoje é de 9. Vem diminuindo, especialmente nos últimos três anos. Essas reduções são motivo de celebração, mas não significa diminuir atenção. É o contrário. A capital vem despertando para a segurança viária. A ideia é que essas quedas validem o esforço".

Dantas afirma que há reuniões periódicas do Comitê Municipal de Segurança Viária, vinculado à Secretaria Municipal de Conservação e Serviços Públicos, com órgãos e atores ligados ao tema, para apresentações e debates. Ele pontua que o problema não pode ser resolvido apenas pelo Poder Público, mas com apoio da sociedade. "O foco está em todos os usuários da via. Da mesma forma que todos têm que estar com condução atenta, obedecendo às leis de transito", alerta o engenheiro civil.

Prefeitura

Para mitigar os atropelamentos e outros acidentes, a Prefeitura de Fortaleza afirma que promove ações permanentes no setor, como a instalação de binários para reorganizar o trânsito em bairros críticos, a ampliação da malha cicloviária, a renovação de sinalizações, travessias elevadas e intervenções no projeto piloto de segurança viária. A avenida Presidente Castelo Branco, a Leste-Oeste, por exemplo, teve a velocidade reduzida de 60 km/h para 50 km/h em fevereiro deste ano. O mesmo acontecerá com a avenida Osório de Paiva. Em malha cicloviária, são 226,3 quilômetros de infraestrutura, segundo a Secretaria de Conservação e Serviços Públicos.

O superintendente da AMC, Arcelino Lima, reconhece que apesar dos investimentos, os dados chamam a atenção. "Ainda é um drama para a cidade, porque embora a gente esteja no terceiro ano consecutivo de redução, a quantidade ainda é assombrosa. É o equivalente a um boeing de fortalezenses morrendo. Como acontece esporadicamente, a sociedade não se sensibiliza tanto", destaca. Parte importante do processo, afirma Arcelino Lima, é a conscientização de atores do trânsito.

Alerta

Mais investimentos ainda são necessários, especialmente para ciclistas de Fortaleza. O alerta é dos usuários de ciclovias e ciclofaixas, que reclamam da conduta de motoristas e até de assaltos comuns a quem pedala pela cidade. O fotógrafo Joislan lima conta que a estrutura "ainda não é suficiente", mas que "o problema maior é a falta de educação dos motoristas e motociclistas que invadem esses espaços". Relata, ainda, que escapou de possíveis acidentes gerados pela imprudência de condutores, além de tentativas de assalto.

Opinião semelhante carrega o advogado e triatleta Apolo Scherer. Com o hábito de pedalar três vezes por semana, reclama mais segurança aos ciclistas que são, segundo ele, desrespeitados principalmente por motoristas de ônibus. "Geralmente passam muito próximos, sem uma distância de segurança", diz. Ele também reforça a necessidade de mais policiamento nas vias para reduzir o número de roubos. "(A malha cicloviária) melhorou muito. Porém, a educação dos motoristas e a falta de segurança prejudica muito a circulação dos ciclistas", lamenta.

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