Casos de hanseníase ainda são altos, e detecção em jovens preocupa

No Ceará, entre 2008 e 2017, foram confirmados 20.353 casos da doença. Apesar da redução dos índices nos últimos anos, a quantidade é alta. Atualmente, a detecção na faixa etária até 15 anos é um dos alertas no Estado

Escrito por Lêda Gonçalves , leda.gonçalves@diariodonordeste.com.br

Doença milenar, da época de Cristo, a hanseníase ainda é grave problema de saúde pública. No Estado do Ceará, entre 2008 e 2017, 20.353 novos casos foram confirmados, sendo, em média, pouco mais de dois mil por ano ou 169 por mês. 

Em Fortaleza, no mesmo período, foram 6.6 mil. Na comparação, houve uma redução da ordem de 39% de confirmações em 10 anos no Estado e de 45% na Capital. Apesar disso, alertam infectologistas, o parâmetro para os padrões da Organização Mundial da Saúde (OMS) e Ministério da Saúde ainda é alto. A maior preocupação agora é com a faixa etária até 15 anos de idade, cuja a taxa de detecção ainda chama atenção. 

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Segundo o mais recente boletim epidemiológico da Secretaria de Saúde do Ceará (Sesa), isso pode significar a existência de fontes de transmissão ativa da doença. “Por isso, faz-se necessária a intensificação das atividades de controle para frear a cadeia de transmissão e reduzir a taxa de detecção nessa faixa etária para zero até 2020, como preconiza a OMS”, adverte a articuladora do Programa do Controle da Hanseníase Estadual, Girlânia Martins.

Indicadores

De acordo com o boletim, no Ceará, em 2008, a taxa de detecção em menores de 15 anos de idade foi de 6,6 para cada 100 mil habitantes. A taxa é a maior já registrada e considerada muito alta pelos parâmetros do Ministério da Saúde. Em 2017 a taxa foi de 2,7 para o mesmo grupo populacional, uma redução de 59,1%. O indicador passou de muito alta para alta. “A situação preocupa muito, pois indica que, como a doença apresenta longo tempo de incubação até seus sintomas, a pessoa adoeceu com menos idade ainda”, frisa Girlânia.

>População infanto-juvenil em risco

A doença, informa, é fácil de diagnosticar, tratar e tem cura; no entanto, quando detectada e tratada tardiamente pode trazer consequências para os portadores e seus familiares, pelas lesões que os incapacitam fisicamente. 

O Centro de Dermatologia Dona Libânia, no Centro de Fortaleza, é referência no diagnóstico e tratamento. Ali, a dona de casa Aline Maria Pereira aguarda a consulta para a filha de 13 anos, Maria Juliana. Temerosas da repercussão social no bairro que moram, elas não quiseram falar muito, mas a mãe conta que a menina apareceu com manchas na pele e sem sensibilidade desde os 12 anos, além de dormência. Mesmo assim, só decidiram procurar ajuda agora. O que é um erro, aponta Girlania. “Logo nas primeiras manifestações é fundamental ir a uma unidade de saúde”. 

Leprosário

O Ceará ainda guarda pesadas marcas do que foi a antiga Colônia Leprosário de Canafístula, denominada atualmente de Centro de Convivência Antônio Diogo. O local completou 90 anos em agosto passado e ainda abriga 12 ex-pacientes que ficaram ali isolados por conta da doença, que naquela época não tinha cura.
Maria Iracy Torres Coutinho tem 70 anos e não se lembra quando foi levada para o antigo leprosário. Ela é uma das remanescentes. “Era jovem, mas já tinha homem, foi ele que me trouxe e foi embora”, discorre com tristeza. No local teve seis filhos, que acabaram sendo retirados de lá. 

O atual diretor geral da unidade, Francisco de Assis Duarte, conta que alguns pacientes não conseguiam nem falar direito até há pouco tempo. “A dor foi tanta que eles simplesmente não suportavam articular ou expressar qualquer coisa que lembrasse aquele tempo de isolamento do mundo”. 

A maioria dos dois mil internos que passaram pelo leprosário morreu ali mesmo. Quem sobreviveu à enfermidade não superou a perda de laços familiares. São poucos que recebem visitas. Duas filhas de Iracy costumam visitá-la vez por outra. Em muitos casos as companhias são ex-pacientes e a equipe médica. 

Centro de Dermatologia

De antigo "depositário" de seres humanos vítimas do bacilo Mycobacterium Leprae, transmissor da hanseníase, o atual Centro de Convivência Antônio Diogo, a 50 km de Fortaleza, reforçará as ações do Estado no combate à proliferação da doença. A partir de novembro próximo, a unidade será um Centro de Dermatologia, dando suporte ao Centro Dona Libânia, referência estadual no diagnóstico e tratamento da enfermidade.

De acordo com o diretor a ex-colônia, Francisco de Assis Duarte, o local terá capacidade para atender toda demanda dos municípios do Maciço de Baturité, possibilitando diagnóstico e encaminhamento para tratamento nas unidades básicas de saúde.

Em Fortaleza, entre 2008 e 2017, houve cerca de 6.600 ocorrências de hanseníase

Em menores de 15 anos, a taxa de detecção no Ceará é de 2,7 registros a cada 100 mil habitantes

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Ex-pacientes ainda moram no Centro de Convivência. Eles ficaram isolados da sociedade por conta da doença que, naquela época, não tinha cura. Sem perspectivas, preferiram ficar no local definitivamente.

39%

Foi a diminuição da ocorrência no Estado em 10 anos. Apesar da queda, o quadro, segundo especialistas, ainda é preocupante; em Fortaleza, o decréscimo foi ainda maior, de 45% dos casos.

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