Adolescentes são retirados de centro de semiliberdade e executados a tiros

Segundo a Polícia, cerca de 20 criminosos invadiram o prédio, levaram seis jovens e mataram quatro deles

Escrito por Messias Borges - Repórter ,
Legenda: Durante a manhã de ontem, ainda era possível encontrar "lembranças" da matança: manchas de sangue pelo asfalto e pelas paredes das residências, cápsulas de balas e projéteis
Foto: Foto: José Leomar

Gritos e tiros que acordaram e apavoraram moradores da Rua Firmo Ananias Cardoso e adjacências, no bairro Sapiranga, em Fortaleza, na madrugada de ontem, dificilmente serão esquecidos. Quatro jovens foram retirados à força do Centro de Semiliberdade Mártir Francisca e acabaram executados, em mais uma chacina ocorrida no Ceará em 2017. A identificação dos internos mortos e os atos infracionais atribuídos a eles não foram repassados pela Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo (Seas).

> Internos reportaram ameaças à Justiça

Segundo informações da Polícia Militar, cerca de 20 criminosos invadiram o Centro de Semiliberdade ao pularem o muro de trás da propriedade. 'Pega-ladrões' foram derrubados, para facilitar a entrada. "Eles chegaram por volta de 3 horas da madrugada em carros separados. Os internos foram retirados de lá e assassinados perto da Comunidade do Muro Alto", afirmou o comandante da Área Integrada de Segurança 7 (AIS 7), major PM Almeida.

Conforme moradores da região, a quadrilha fez um vigilante do prédio e socioeducadores de reféns e os trancou em salas. Gritos como "é a Babilônia" (fazendo referência à uma comunidade localizada no Barroso) e "quem é da GDE?" (referindo-se à facção criminosa Guardiões do Estado) foram ouvidos.

A chacina poderia ter sido maior. Seis jovens foram escolhidos pelo bando e levados até a Rua Firmo Ananias Cardoso. Entretanto, ao chegarem lá, os atiradores liberaram dois deles. Os outros quatro foram assassinados com vários tiros.

Com medo, os moradores conversaram com a reportagem, mas não quiseram se identificar. "Quando eu ouvi os tiros, me escondi embaixo da cama. Ninguém teve coragem de olhar quem era. Eles gritavam 'não corre não, que tu vai morrer'", relatou uma moradora. "Eu fiquei me tremendo, senti foi uma dor no coração", disse um idoso. A Polícia Militar chegou cerca de 20 minutos após as dezenas de disparos. Os criminosos já haviam fugido e os jovens estavam mortos. A Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), da Polícia Civil, e a Perícia Forense do Ceará (Pefoce) compareceram ao local para levantar informações sobre a chacina. Em seguida, os peritos recolheram os corpos dos adolescentes.

Durante a manhã de ontem, ainda era possível encontrar "lembranças" da matança: manchas de sangue pelo asfalto e pelas paredes das residências, cápsulas de balas e projeteis.

No início da tarde, a Polícia Civil já havia identificado integrantes da quadrilha que cometeu a chacina, mas não revelou a identificação. Ninguém foi preso pelo crime até o fechamento desta matéria. A informação sobre a identificação foi revelada pelo Governo do Estado.

O governador Camilo Santana e a vice-governadora Izolda Cela se reuniram com responsáveis das secretarias da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) e da Justiça e Cidadania (Sejus) e da Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo (Seas), na manhã desta segunda (13), para tratar sobre a chacina e decidir os procedimentos para a investigação do caso.

Poucas horas após os crimes, por volta de 7h, cerca de 15 internos do Centro de Semiliberdade Mártir Francisca fugiram pela porta da frente. Segundo uma profissional de uma instituição ligada ao Governo, que esteve na unidade em reunião com outras entidades, os adolescentes fugiram por medo de acontecer outro episódio de violência.

A PM foi rapidamente acionada e recapturou aproximadamente dez infratores. Por estarem em um Centro de Semiliberdade, os jovens ficam reclusos de segunda a sexta-feira e voltam para casa nos fins de semana. A invasão e a chacina aconteceram poucas horas após os internos retornarem ao Centro.

Comunidade

A comunidade que mora ao redor do Centro de Semiliberdade relatou que nunca tinha ocorrido um episódio de tamanha violência, na região. "Tem uma morte aqui, outra acolá. Mas desse jeito não", relatou uma mulher. Os moradores veem a manutenção da unidade socioeducativa na região com maus olhos, porque, para eles, atrai violência para o local. As fugas de internos são recorrentes, acrescentaram. "Nós queríamos uma creche. Isso (apontando para o Centro), dentro da comunidade, não pode", lamentou o aposentado Raimundo Nonato do Carmo, de 64 anos de idade.

A Superintendência do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo (Seas), responsável por administrar o Mártir Francisca, lamentou a matança, em nota. "A Seas lamenta profundamente o ocorrido e trabalha no apoio às famílias dos adolescentes - e dos demais internos. Em paralelo, a Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE) iniciou os trabalhos de investigação no intuito de elucidar a ocorrência. Equipes da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e da Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce) realizaram os primeiros levantamentos no Centro. A Polícia Militar intensificou o policiamento na região com o reforço de equipes dos Batalhões Especializados, como o de Polícia de Choque (BPChoque) e o de Policiamento de Rondas e Ações Intensivas e Ostensivas (BPRaio)". Até o fechamento desta matéria, nenhum suspeito da chacina havia sido preso.

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