Reforma previdenciária é necessidade aritmética

Em meio às discussões sobre a PEC da Previdência, economista destaca a necessidade de uma reforma para o futuro do País, diz que o ajuste fiscal é difícil, mas projeta retomada do crescimento já em 2017

Escrito por Áquila Leite - Repórter ,
Legenda: Conforme o secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, a reforma é necessária para manter os gastos sociais
Foto: FOTO: THIAGO GADELHA

Sempre que você tem a oportunidade, gosta de alertar sobre os rumos que a Previdência Social tem tomado no Brasil. Estando agora no governo, qual sua percepção sobre esta realidade?

O diagnóstico não mudou. O Brasil ainda é um país relativamente jovem, mas que já gasta muito com previdência. A gente tem visto também vários regimes especiais de aposentadoria. Assim, para conseguirmos manter os gastos sociais e até ampliá-los, é preciso fazer uma reforma. É muito claro, qualquer que seja a visão que se tenha de Brasil, que será preciso, por uma necessidade aritmética, haver a reforma. Há divergências de como fazer, qual será o período de transição, entre outros detalhes. Por isso que existe um grupo de trabalho discutindo o assunto. O resultado disso se transformará em uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC).

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Há uma previsão de quando a PEC da Previdência será apresentada?

Ainda estamos nas discussões. O próprio ministro da Fazenda (Henrique Meirelles) falou que possivelmente nos próximos dois ou três meses, se terá uma primeira proposta. A reforma de previdência sempre é algo que tem uma discussão muito grande. Então, com o governo construindo uma reforma de previdência em conjunto com as centrais sindicais, em dois, três meses, eu acho um prazo razoável, pelo o que se tem de experiência mundial.

Seria necessária uma mudança muito drástica para colocar o País nos eixos?

Em todos os países do mundo que se fez reforma de previdência, nunca ouve algo drástico. Sempre há um período de transição a ser negociado. Exatamente neste período que se define quantas pessoas, a partir de que idade, entrarão na regra nova. Se as pessoas que já estão no mercado de trabalho entram. Isso será negociado em um debate transparente e aberto. Nenhuma reforma previdenciária foi drástica. Até porque previdência é algo de médio e longo prazo. O objetivo é tornar o sistema sustentável para o futuro. Não é de curto prazo.

Já existe, por parte do governo, uma proposta inicial?

Há várias propostas, mas, por não participar deste grupo da previdência, não sei dizer todas. Mas há várias na mesa, seja do Ministério da Fazenda, da Casa Civil, das centrais sindicais, de associações empresariais, etc. Tudo está sendo debatido de forma transparente e calculada. A reforma será uma consequência deste estudo.

Os direitos adquiridos correm risco?

Direito adquirido é respeitado em qualquer boa reforma da previdência. Mas, por exemplo, uma pessoa que tem 18 anos, não tem direito adquirido. Não sei como será a reforma aqui exatamente, mas quando se olha para os modelos do mundo, as pessoas que estão próximas a se aposentar, dentro das regras atuais, o direito é mantido. Todo esse cuidado será considerado pelo governo e pelas centrais sindicais que estão discutindo o processo.

Quando podemos esperar uma decisão final sobre o assunto?

O envio da PEC possivelmente deve acontecer até o fim deste ano, levando em conta que em dois, três meses deve ser apresentada a primeira proposta ao Congresso. Agora a aprovação ninguém sabe se sai em 2016, pois, em geral, a reforma de previdência precisa ser bem discutida com a sociedade.

A equipe econômico atual foi uma das mais bem aceitas pelo mercado nos últimos anos. O que é possível fazer para justificar essa confiança?

Você ter na coordenação um ministro com o poder de montar sua equipe e com a liberdade de apresentar propostas, além de se comunicar muito bem com o mercado, eu diria que é o primeiro passo para se propor políticas públicas claras e boas. O que vai sair daí passa por um processo de discussão no Congresso. Porque ajuste fiscal, em qualquer lugar do mundo, depende muito de Congresso, principalmente no Brasil, que é um país que, no âmbito do governo central, 90% das despesas são obrigatórias. Então, eu diria que o ministro da Fazenda, com apoio político e aliado ao setor público e privado, ajudará no processo de levar a discussão do ajuste fiscal adiante. Esperamos apoio ao ajuste que o Brasil precisa.

O quão difícil é fazer este ajuste fiscal no Brasil?

Muito do ajuste fiscal passa por um processo de esclarecimento. Em qualquer lugar do mundo, o ajuste é sempre difícil, pois significa aumentar a receita ou cortar despesas. E ninguém quer pagar mais impostos ou ver os investimentos caindo. É difícil, mas chegou um momento em que a sociedade brasileira sabe que não pode simplesmente empurrar este problema com a barriga. O País precisa fazer um ajuste fiscal para controlar o avanço da dívida e começar a reduzi-la. Quando o mercado enxergar que isso vai acontecer, o efeito será imediato. Isso já se transforma em uma melhoria do ambiente de negócios, queda de taxa de juros e aumento de investimento.

O Brasil tem uma das maiores taxas de juros do mundo, com a Selic atualmente em 14,25% ao ano. Quando a veremos recuar?

É preciso lembrar que o Brasil também tem uma taxa de inflação muito alta. Em 2015, por exemplo, foi quase 11%. Entretanto, se avançarmos no ajuste fiscal, com a inflação em queda e com as contas públicas equilibradas, a consequência natural é a queda da Selic. Mas isso será resultado de um dever de casa que o País tem que fazer.

Há uma projeção de quando sairemos, de fato, da crise?

Os indicadores que chamamos de antecedentes, eles começaram a melhorar. A própria pesquisa Focus, que é uma média do mercado, já aponta um crescimento do PIB de 1% em 2017. Há, ainda, algumas consultorias falando em 1,5% e até em 2%. Há várias estimativas, mas todas apontam que a partir de 2017 a economia começará sua recuperação. Se simultaneamente avançarmos no ajuste fiscal, no plano de concessões e privatização, acho que vai ter uma grande onda de confiança no Brasil e esta retomada do crescimento será mais rápida.

*Secretário do Ministério da Fazenda

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