Habitação: preços e temor de dívida dificultam acesso

Maioria de futuros mutuários não consegue arcar com valor da moradia e empréstimos de longo prazo

Escrito por Redação ,

Com avanço expressivo no volume de financiamentos nos últimos anos e contando com novos incentivos por parte do poder público, o setor imobiliário continua a se expandir no País, onde a demanda por moradias concentra milhões de brasileiros de todas as classes. Todavia, mesmo diante do leque maior de facilidades para a aquisição de imóveis, a incapacidade dos consumidores de arcar com os preços oferecidos e a hesitação para assumir dívidas de longo prazo em meio a um cenário de incertezas se apresentam como desafios cuja solução ainda parece distante.

No Ceará, onde os financiamentos imobiliários ultrapassaram R$ 1,8 bilhão em 2013, a dificuldade para encontrar um imóvel cujo valor caiba no bolso impacta na distribuição dos moradores de Fortaleza e cidades vizinhas, nas quais bairros com infraestrutura deficiente recebem número crescente de habitantes.

Ao mesmo tempo, iniciativas como o Minha Casa, Minha Vida têm reduzido significativamente o déficit habitacional da capital cearense - um dos maiores do País. Contudo, a execução da iniciativa evidencia que ainda há um longo caminho a ser percorrido em relação às políticas habitacionais, as quais não são vinculadas às ações urbanísticas.

A sensação dos fortalezenses de que não há imóveis compatíveis com a renda não é de hoje. A alta nos valores de casas e apartamentos teve início há cerca de oito anos, quando o aumento da demanda gerou um "boom" no setor, que hoje dá sinais de estabilização nos preços.

> 'Minha Casa, Minha Vida' impulsionou moradia

Fatores

Conforme explica a professora do Núcleo de Real Estate da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) Eliane Monetti, o aumento expressivo nos preços de imóveis em todo o País, há quase uma década, aconteceu devido a "uma conjunção de fatores".

O primeiro deles, indica, foi a redução na taxa de juros, por volta de 2005, que permitiu aos bancos a criar condições de financiamento que se enquadrassem à situação financeira de um público que antes não encontrava espaço nesse mercado. "Isso alongou o prazo e o poder de compra dessas pessoas aumentou em torno de 30%. Foi como se aumentasse o que elas ganhassem", ilustra Eliane.

Diante da demanda expressiva que passou a pressionar o mercado, acrescenta, as empresas passaram realizar uma série de investimentos. Muitas delas, destaca a professora, abriram capital, tornaram-se maiores e ampliaram significativamente a capacidade de produção.

"Isso tudo provocou uma oferta acentuada dos imóveis e um público com capacidade de adquirir. Mas tanto o custo dos insumos quanto a procura por mão de obra não acompanharam essa velocidade, e isso levou a uma inflação dos custos", destaca, acrescentando que a renda dos brasileiros não evoluiu na mesma proporção nesse período.

Para Eliane Monetti, esses fatores resultaram em um aumento dos preços desproporcional aos custos. Entretanto, frisa, o cenário voltou a se ajustar nos dois últimos anos, atingindo agora "um patamar mais equilibrado". De todo modo, complementa, a insegurança dos brasileiros por conta do receio ligado aos resultados da economia nos próximos meses tem inibido muitos compradores. "Quando as pessoas começam a ver a economia fraquejando, passam a ter medo de perder emprego, então não querem assumir uma dívida de 20 a 30 anos", aponta. Segundo ela, o comportamento do setor imobiliário, no próximo ano, estará diretamente ligado ao desempenho da economia e à postura dos brasileiros diante das possibilidades que bancos, construtoras, imobiliárias e o próprio governo tentam explorar.

O QUE ELES PENSAM

Há boas condições no setor
As condições de financiamento nunca foram tão boas. Um problema que tem acontecido é que os empreendedores confundem mercado com oferta. Mas oferta, na verdade, é demanda. O que temos no Brasil são algumas empresas que estão num momento ruim por conta da quantidade de estoques que criaram. É preciso que os empreendedores estejam atentos às necessidades e às particularidades dessa demanda.

Cristiano Rabelo
Consultor e professor da FGV

É difícil prever se haverá queda dos preços no próximo ano, porque há vários fatores que vão determinar isso. De todo modo, há boas condições para os financiamentos. No Brasil, o crédito imobiliário tem sido oferecido com muito critério, e é positivo que continue assim. A nossa inadimplência no crédito imobiliário é de menos de 2%. Esse número é relativamente baixo comparado aos índices de outros países.

Eduardo Coutinho
Professor do Ibmec

João Moura/Jéssica Colaço
Repórteres

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