Famílias reduzem dívidas por aperto na renda

Brasileiros não estão buscando contrair novas dívidas e estão se desfazendo de bens para sair do vermelho

Escrito por Redação ,
Legenda: O consumidor quer comprar, mas a prioridade para 47,3% dos inadimplentes é buscar um acordo com credores para limpar o nome

São Paulo/Fortaleza O endividamento das famílias atingiu em junho deste ano o menor patamar desde dezembro de 2012. Mas o que, à primeira vista, poderia indicar um alívio, tem um lado perverso. A fatia de dívida na renda do brasileiro tem caído por causa do desemprego e do aperto do crédito.

De acordo com dados do Banco Central, o nível de endividamento das famílias recuou em junho, último dado disponível, para 43,7% da renda anual. Em abril de 2015, quando atingiu o maior patamar da série histórica iniciada em 2005, foi de 46,4%. "O indicador caiu porque o consumidor está fazendo menos dívidas", afirma Flávio Calife, economista da Boa Vista SCPC.

Segundo a instituição, a demanda por crédito do consumidor recuou 6% nos últimos 12 meses. "Há também o ajuste pelo consumo: com a piora do mercado de trabalho e o aumento da inflação, os orçamentos apertaram muito", diz.

Nos últimos anos, com a expansão da economia brasileira e medidas de estímulo ao consumo, houve um crescimento na concessão de crédito. "Várias medidas do governo estimularam um excesso de endividamento, como reduções de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e bancos públicos oferecendo crédito barato", diz Luiz Rabi, economista da Serasa Experian.

A rápida deterioração da economia brasileira, no entanto, colocou fim à bonança e levou ao aumento da inadimplência. Sem emprego, a secretária Isabel Silva entrou para esse grupo. "De repente minha renda não era mais compatível com os gastos e dívidas", conta. Com três cartões de crédito estourados e no limite do cheque especial, ela teve de partir para as renegociações.

Na jornada que percorreu para sair do vermelho, ela conseguiu quitar um cartão e renegociar outro. As demais dívidas ainda dependem de um acordo. "Tinha semana que não conseguia dormir. Tinha vergonha de passar por isso", afirma. Hoje, de volta ao mercado de trabalho e menos pressionada, ela já traça metas para ficar em dia com as dívidas. "Até o fim do ano quero resolver todas".

Acordos

O caminho seguido por Isabel tem sido cada vez mais comum. Segundo o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), 47,3% dos inadimplentes pretendem buscar um acordo com credores para limpar o nome. Em 2015, esse porcentual era de 37,2%.

Outra estratégia utilizada pelos inadimplentes é o bico. São 22,9% os que recorrem a essa modalidade de renda extra. Isabel Silva, por exemplo, já vendeu lingerie e pijamas, e ainda faz bolos e salgados para complementar a renda. "Já fiz de tudo um pouco para conseguir dinheiro e pagar minhas despesas".

Inadimplência

Na avaliação da economista da Confederação, Marianne Hanson, o endividamento vinha caindo, não em função da melhora das condições das famílias, mas por causa do receio de consumir e da situação econômica do País como um todo.

"As dívidas vinham diminuindo em função da retração do consumo. Essa mudança de comportamento pode indicar alguma melhora, porém, as altas taxas de juros e o mercado de trabalho desaquecido continuam sendo um entrave para a retomada das compras. As famílias ainda estão inseguras para consumir ou contrair novas dívidas", disse.

Os números de agosto indicam um aumento no percentual das famílias que têm dívidas em atraso seja no cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, empréstimo pessoal, prestação de carro ou seguro. Esse número subiu 24,4% em julho, um aumento de 2 pontos percentuais em relação a julho (22,9%), mantendo ainda um patamar elevado.

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