Endividamento encolhe a renda
Estudo da Nielsen revela que com menos dinheiro disponível, as famílias compram menos artigos para o lar
De acordo com o levantamento da Nielsen sobre as mudanças no mercado consumidor nesses quase 20 anos de Real, a dívida de longo prazo do brasileiro - basicamente carros e imóveis- é um dos fatores que, atualmente, vem prejudicando o consumo no varejo no Brasil, sobretudo nas compras para abastecimento da casa.
Com o orçamento mais comprometido, sobra menos dinheiro para as despesas recorrentes do mês nesse quesito, fazendo com que os hábitos de consumo adquiridos nessas duas últimas décadas passem a ser revistos.
Cultura
"Na era pré-real, o consumidor não tinha tanto a cultura do endividamento incorporada ao orçamento familiar, mas com a estabilidade e a expansão do crédito e as facilidades que surgiram, a população passou a comprar mais a prazo, muitas vezes por períodos mais longos. Porém, ela não tinha claro o quanto da sua renda poderia comprometer com dívidas", argumenta o economista e diretor técnico da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Ceará (Fecomércio-CE), Alex Araújo.
De fato, conforme os dados da Nielsen, o percentual de comprometimento da renda acumulada anualmente pelas famílias brasileiras com dívidas de longo prazo quase que dobrou entre os anos de 2006 e 2013, saindo de 24,5% para 45,5%.
E o impacto dessas dívidas adquiridas sobre o consumo de novos itens, constatou a empresa, ficou facilmente perceptível quando se compara a proporção do orçamento que uma família não endividada direciona da sua renda para abastecer o lar (22%) e aquela que possuí muitas dívidas (18%).
Gastos superam salário
Outro fator que implica em menor possibilidade de consumo é que, conforme a pesquisa, a classe média brasileira gasta 15% a mais do que ganha.
O levantamento mostra que os lares classificados nessa camada social têm renda média de aproximadamente R$ 2,9 mil, mas os gastos são da ordem de R$ 3,1 mil.
Já as classes D e E têm renda média de R$ 1,5 mil e gastam o que ganham, enquanto as classes A e B apresentam renda média de R$ 4,8 mil, mas além de consumir procuram aplicar o dinheiro em reservas e educação financeira e também em investimentos.
Novas despesas surgiram
Ao lado do endividamento, acrescenta Alex Araújo, novos grupos de despesas que antes também não faziam parte do orçamento doméstico agora contribuem para a diminuição da renda disponível. "Nesse contexto, com a universalização de serviços como telecomunicações, as famílias passaram a ter mais despesa com telefonia fixa, telefonia móvel, internet e TV a cabo. Aqui no Ceará, por exemplo, aumentou muito também, nos últimos cinco anos, o número de pessoas que passaram a consumir planos de saúde e educação particular, reduzindo, dessa forma, a sua renda disponível", explica o economista.
Itens tradicionais
Segundo ele, essa mudança no padrão de consumo afetou, de certa forma, a compra de itens tradicionais, incluindo aí, notadamente, a alimentação.
"Então esses novos grupos de despesas ao lado das compras financiadas diminuiram a renda que as famílias, ao fazerem as suas contas, dispõem. Fala-se que não se deve comprometer mais do que 30% do orçamento mensal com dívidas, mas mesmo assim isso ainda deixa pouca folga para as famílias gastarem com produtos e serviços para o cotidiano da casa", conclui o especialistas. (ADJ)
