Crédito imobiliário ajuda a construir direito à moradia

Especialistas demonstram que democratização do financiamento para aquisição de domicílios é opção para reduzir déficit habitacional no País

Escrito por Raone Saraiva e Yohanna Pinheiro - Repórteres ,

Apesar de políticas de habitação implementadas pelo governo nos últimos anos, com o Minha Casa Minha Vida (MCMV), milhões de brasileiros ainda estão sufocados pelos aluguéis, precisando morar com familiares ou vivendo em casas improvisadas em locais de risco. A menor capacidade de investimento público e corrosão do orçamento familiar, devido à crise econômica, complica ainda mais o cenário.

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Nesse contexto, enquanto políticas públicas são readaptadas, o financiamento imobiliário aparece como um instrumento que pode, ao menos, amenizar o problema do déficit habitacional no País. A tese é reforçada pelo estudo "Crédito e Formação de Domicílios no Brasil", que mostra uma expansão de 100% no volume de financiamentos, aumentando em cerca de 10% o número de domicílios brasileiros.

Segundo os autores Lilian Pacheco de Medeiros Ferro, Gabriel de Abreu Madeira e Fani Léa Cymrot Bade, os resultados mostram a importância de aprimorar o acesso a mecanismos de financiamento à moradia para reduzir o déficit. No estudo, eles avaliam que esses mecanismos podem incluir tanto o mercado de crédito como de aluguéis, embora observem que esse segmento não é acessível a todo o conjunto da população brasileira.

Na avaliação do professor de Direito Machidovel Trigueiro Filho, da Universidade Federal do Ceará (UFC), o maior acesso ao crédito imobiliário nos últimos oito anos proporcionou significativa queda no déficit habitacional. "Mas essa dinâmica que foi crescente desde 2009 encontra-se estável há pelo menos dois anos, e penso que continuará até o final de 2017, com pouca melhora, dependendo ainda de respostas das variáveis econômicas e políticas, nesse ano", analisa.

No entanto, o professor avalia que a continuidade da queda dos juros do financiamento imobiliário - que já está acontecendo nos dois últimos meses - e algumas mudanças no rigor de aprovação do crédito pelos bancos, de forma a promover o acesso da população mais carente à compra de imóveis financiados, seria uma forma de reverter a estabilidade do déficit habitacional desses dois últimos anos.

Fontes

São duas as principais fontes do crédito imobiliário: recursos provenientes da poupança, cuja penetração é maior na classe média e que permite, hoje, financiamento de imóveis de até R$ 1,5 milhão; e do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), mais popular, com taxas mais baixas e uma linha atrelada ao MCMV, com subsídio do governo. Elas compõem o Sistema Financeiro da Habitação (SFH).

De acordo com Ana Castelo, coordenadora de Estudos da Construção Civil do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV IBRE), a quantidade de unidades financiadas tem recuado por conta da crise. "Em 2014, 538 mil unidades tinham sido financiadas com a poupança. Esse número caiu para 341,5 mil em 2015, e 199,6 mil em 2016. A oferta de crédito ficou mais restrita e a capacidade de pagamento das famílias foi afetada", observa.

Já as linhas financiadas com o FGTS, com taxas menores que a do mercado, foram menos impactadas. A coordenadora destaca que, em 2014, recursos das contas do FGTS bancaram o financiamento de 486 mil novas unidades, enquanto em 2016 foram 474 mil. "Não fossem os recursos do FGTS, a situação teria ficado ainda mais complicada para o setor da construção civil", destaca Ana Castelo.

Subsídios

Reconhecendo a importância do financiamento imobiliário, a coordenadora pondera que o déficit habitacional não pode ser resolvido sem subsídios do governo para políticas públicas de habitação, uma vez que a maior parte das pessoas que compõem o déficit são de baixa renda. "Não é que não tenha oferta de imóveis no mercado, mas as pessoas não têm condição financeira para adquirir", explica.

Para além disso, ela aponta que pode-se pensar em outras políticas, mais que a concessão do imóvel subsidiado. "O aluguel social tem sido utilizado em vários lugares no mundo e já foi usado no Brasil, mas teve problemas. Pode voltar a ser discutido", avalia. O governo federal, inclusive, estuda essa possibilidade, segundo admitiu o ministro das Cidades, Bruno Araújo. O projeto ainda está em fase de planejamento.

Reconhecendo o financiamento imobiliário como uma ferramenta importante para auxiliar a redução da carência por habitação, Ana Castelo pondera que uma ampliação do acesso ao crédito precisa passar pela volta do crescimento econômico.

"Entre 2010 e 2012, o crescimento da renda permitiu que mais pessoas tivessem acesso ao financiamento imobiliário. É uma condição fundamental para vermos a retomada do crescimento do mercado", destaca.

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