Consumo no Brasil volta ao patamar de 2010
Pesquisa da Kantar Wordpanel mostra que a maioria das classes socioeconômicas reduziu os gastos
São Paulo/Fortaleza. Depois da redução no consumo de bens duráveis, agora os brasileiros estão diminuindo a compra de itens básicos, como alimentos, bebidas e artigos de higiene e limpeza. Segundo levantamento da Kantar Wordpanel, empresa de pesquisa especialista em comportamento de consumo, em 2015, o volume desses itens comprados pelas famílias caiu 2% no País em relação a 2014. A mesma retração foi verificada no Nordeste.
Considerada a inflação, a variação negativa corresponde a uma queda real de cerca de 10%, indicando que as quantidades consumidas desses quesitos voltaram aos patamares de 2010. Já em relação ao valor gasto, a cesta de alimentos ficou estável no Brasil, enquanto no Nordeste o gasto aumentou 1%. Neste cenário, o varejo busca se adaptar à nova realidade de consumo.
Conforme a pesquisa da Kantar Worldpanel, as vendas no varejo registraram queda de 4,3% no ano passado. A frequência de compra anual diminuiu em todas as regiões. A crise fez com que a classe AB reduzisse o consumo, com queda de 6% nas unidades e de 5% nos gastos. A classe B2 também sentiu o impacto e reduziu em 2% as unidades e em 1% os gastos. Na classe C1, houve retração de 2% nos itens e de 1% no valor. Já na classe C2, as unidades caíram 1%, mas os gastos cresceram 2%. Por fim, na classe DE, houve crescimento no número de unidades e nos gastos: 1% e 3%, respectivamente.
Diante da necessidade de planejamento nas compras, o "atacarejo" foi o único canal de vendas que registrou crescimento no ano passado, com aumento de 26% nas unidades vendidas e 32% de valor.
Freio
A diretora da Kantar Wordpanel, Christine Pereira, afirma que o freio no consumo interrompeu uma sequência de crescimento de quantidades consumidas de bens não duráveis que vinha desde 2008. Segundo ela, em termos de valor, o gasto sempre crescia, ano a ano, na casa de dois dígitos. Em 2015, por causa da crise, esse quadro mudou.
Processo
Para o economista Alex Araújo, o varejo passa por um "processo" de redução no consumo das famílias. "A inflação tem corroído o valor do dinheiro. Associado a isso, o endividamento da população tem comprometido o valor que as famílias destinam ao consumo. Esse é um movimento percebido pelo comércio nacional. No Ceará, onde temos a 4ª menor renda, o impacto é ainda maior", afirma.
Segundo Alex Araújo, esse movimento começou com a queda no consumo de produtos duráveis e se ampliou com a substituição de produtos e de marcas. "Agora, o consumidor tem ido mais vezes ao supermercado para aproveitar as promoções do dia e também tem pesquisado mais antes de compra", destaca. Conforme ele, o consumidor tem feito "um esforço para se ajustar ao cenário". "O que pode adiar, o consumidor adia, e o que não dá para adiar, ele opta pelo mais barato", afirma.
O presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Fortaleza, Severino Ramalho Neto, acredita na adequação do varejo ao novo perfil de consumo e afirma que o cenário não é tão ruim. "Vínhamos num crescimento direto do consumo. Foram os anos do varejo em que a projeção era chegar ao céu rapidinho, mas não foi assim. Agora não é mais o céu, mas também não é o inferno que pregam por aí", garante.
Severino lembra que as classes D e E e parte da C seguem ampliando o consumo. "O que está acontecendo é uma adequação do consumo. No Brasil, são muito importantes para o varejo as classes C, D e E pois são elas que consomem mais. Essa pesquisa é ótima para ajudar o varejo a se ajustar. E ele já está fazendo isso. Um exemplo é o 'atacarejo'", destaca.
Como empresário do setor supermercadista, Severino afirma que a crise chega a ser positiva. "Alguns estão até crescendo, enquanto outros estão sentindo mais. É normal. A crise tem esse lado favorável, de propiciar o aperfeiçoamento", acrescenta.