Em meados do século passado, incontável fazia-se o número de ciganos, cartomantes, quiromantes, videntes e agoureiros encontrados por toda a Fortaleza. Emissoras radiofônicas mantinham programas diários, ao vivo, de consultações astrológicas, respondendo cartas – até íntimas – de ouvintes. Um anunciado Kardo Ali não sei o quê, na Rádio Iracema, era o maior líder de audiência, alardeavam. O odontólogo, escritor e excelente contador de histórias Erivaldo Façanha, dentre vários, narra um causo, assemelhado com outros registrados na época. Francisco Silva, conhecido como Chico, encontrou o consultório, que um dito adivinho abrira e realizava atendimento aos consulentes, próximo da Praça do Ferreira. Pagou consulta e aguardou a vez. O esotérico examinou sua mão, em seguida fechou os olhos e descreveu premonições. Em breve, sofreria atropelamento. Dada a gravidade, teria internação hospitalar, enfrentaria cirurgias melindrosas e, mesmo com dificuldades, escaparia. Mas, em tempos depois, via sua morte. Dessa feita, a causa não seria veículo e, sim, a vaca. Chico nem mais se lembrava do adivinhão, quando sofreu um brutal acidente automobilístico e passou por enormes traumas. Tão logo convalesceu, recordou da predição da vaca. Decidiu morar em São Paulo, na capital, pois ali inexistiria o animal e, assim, estaria afastada, definitivamente, qualquer possibilidade do indesejado vaticínio. Anos transcorreram. Findo o expediente, parou num viaduto e, tranquilo, apreciava o intenso fluxo do trânsito de carros e de pessoas, nas ruas em baixo e ao longe, da desenvolvida metrópole. De repente, gritos: “Olha a vaca! Olha a vaca!”. Instintivamente, vivificou o presságio e, em desesperada ação de defesa, jogou-se do alto. Passantes, lamentavam o que achavam parecer suicídio. E o vendedor de bilhete da Loteria Federal, alheio a tudo, benzia-se.